domingo, 27 de junho de 2010

A visão antropocêntrica dos economistas e suas consequências

* Por Maurício Novaes Souza

Percebe-se que a visão econômica privilegia o imediatista. Dada a sua importância, essa questão é muito grave. Isso porque, desta forma, temos a ciência econômica completamente equivocada em relação aos vários problemas atuais. Não raramente, observa-se que os modelos dos economistas não possuem uma única variável que inclua a contribuição dos recursos naturais. Mesmo os recursos naturais tangíveis (aqueles que podemos pegar, tais como metais e petróleo) são até hoje considerados pela macroeconomia totalmente irrelevantes para explicar o processo econômico.

Na verdade, a maioria dos economistas considera os bens da natureza de livre acesso e infinitos. Acreditam que a economia pode ser maior que o planeta e outros absurdos como, por exemplo, a crença de que o planeta é um subsistema da economia, e não o inverso. A realidade física, biológica e ecológica não está sendo considerada pelas teorias. É necessário que se façam uma inversão de eixos o mais rápido possível porque esse tipo de visão criou um conflito entre o sistema econômico/indivíduo/natureza, da qual todos dependem.

O sistema econômico deve ter como preocupação básica a sociedade e o meio ambiente, já que todas as atividades econômicas interferem diretamente na gestão e na sustentabilidade dos serviços ambientais dos quais todos dependem. Estamos vivendo uma das maiores externalidades ambientais do sistema. Sem a inclusão daquelas variáveis, o sistema está caminhando para um colapso total. É mais do que urgente a economia mudar esta visão. Por mais de meio século correntes teóricas contrárias às vigentes nunca tiveram suas teses e críticas refutadas. No entanto, os economistas teimam em manter a mesma visão de eterno crescimento das economias sem levar em conta a importância da água e do solo fértil, e que os recursos são finitos e cada vez mais escassos em todo o mundo. Considere-se ainda o crescimento da degradação.

Segundo Penteado, professor e economista, os profissionais de sua categoria não entendem que o problema ambiental não surgiu do acaso, mas do sistema econômico e das ações diárias individuais. Não há como encontrar uma solução para o problema que a humanidade enfrenta hoje dentro do paradigma atual. Da forma como está, a economia se desvincula da realidade e não entende que o problema ambiental surge do modelo de produção do sistema econômico, das atividades industriais e comerciais, bem como das ações diárias individuais.

Nas instituições de ensino, a economia precisa ser uma ciência que se comunique com as demais, pois ela interfere na gestão do planeta e nos serviços ecológicos dos quais todos dependem. Não dá mais para assumir que a economia seja neutra em relação à natureza. Todos têm de ter conhecimento das demais ciências, em especial das que lidam com a biodiversidade e os ecossistemas. Precisamos ter conhecimentos de física, química e matemática, bases das demais vertentes científicas. A ciência precisa incluir uma análise social mais apurada para alegar que o crescimento econômico gera benefícios, mas também gera distorções e degradação. É preciso transformar essa ciência tão “matemática” em ciência social – esse deveria ser o objetivo maior.
Os primeiros relatórios sistêmicos da situação dos ecossistemas foram lançados em 2006 e 2008, no projeto Millennium Ecosystem Assessment – uma avaliação simplesmente trágica do impacto do homem sobre a Terra. A crescente demanda por recursos cruciais aos processos produtivos, como a água, indica que estamos caminhando para um cenário de insustentabilidade. No caso brasileiro, tipicamente agrícola, em um recente relatório intitulado "Os impactos da soja na safra 2009/2010" realizado pelo Centro de Monitoramento de Agrocombustíveis (CMA) da ONG Repórter Brasil, mostrou que o estado do Mato Grosso continua apresentando problemas ambientais e trabalhistas devido à atividade produtiva da soja. A região Oeste da Bahia, área de Cerrado, também tem despontado como território de expansão da sojicultura causando danos irreversíveis no meio ambiente, particularmente sobre os recursos hídricos.

Sabe-se que a água só existe porque existe a biodiversidade. A questão da interdependência é extremamente importante. Infelizmente, vivemos em uma sociedade individualista e vemos a interdependência como algo negativo. O exemplo da floresta amazônica é bastante importante: cerca de 50% da água da Amazônia vem da evaporação dos oceanos e os outros 50% da transpiração vegetal. A água da Amazônia só existe porque há floresta e a floresta só existe porque há água. O aquífero Guarani depende da existência do cerrado; se ele desaparecer, a água também desaparece, e junto com ela a agricultura.

A comunidade científica vem alertando para a atual situação, extremamente crítica. Acredito que as informações e os alertas deveriam ser maiores para as pessoas modificarem seus hábitos de extremo desperdício de matéria e energia, como se elas fossem abundantes e eternas. O modo de vida atual não tem o menor compromisso com o planeta nem com as gerações futuras. É preciso que estejamos atentos às falsas promessas do capitalismo.

1. Engenheiro Agrônomo, Mestre em Recuperação de Áreas Degradadas, Economia e Gestão Ambiental e Doutor em Engenharia de Água e Solo. É professor do IF Sudeste MG campus Rio Pomba e Diretor-Geral do IF Sudeste MG campus São João Del Rei. E-mail: mauriciosnovaes@yahoo.com.br.

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