sábado, 23 de setembro de 2017

Economia Ambiental: contribuições para a alteração dos modos de produção e consumo


* Maurício Novaes Souza

O tempo necessário para que o desenvolvimento da Terra permitisse criar as condições necessárias para que a vida em sua superfície pudesse se desenvolver a ponto de gerar a enorme diversidade que habita o planeta atualmente, foi de aproximadamente 3 bilhões de anos. Desde períodos imemoriais, dos primeiros primatas ao moderno homo sapiens, o homem se viu na necessidade de interagir com o meio em que vive de forma a retirar da natureza toda espécie de recursos necessários à sua sobrevivência - dos alimentos à energia.
Sabe-se que o clima do nosso planeta é um complexo sistema resultante da interação de cinco fatores: a atmosfera, os oceanos, as regiões com gelo e neve (criosfera), os organismos vivos (biosfera) e os solos, sedimentos e rochas (geosfera), todos eles, por sua vez, em estreita ligação com o sol. Somente nesses termos é possível compreender os fluxos e ciclos de energia e matéria da atmosfera, imprescindível para investigar as causas e os efeitos de possíveis alterações em nosso Planeta capazes de produzirem, por exemplo, as mudanças climáticas – um dos assuntos mais polêmicos e controversos desde o início deste século!
Além desses 5 fatores, deve-se considerar, de forma destacada, o fator ANTRÓPICO - resultante da atividade humana. A “antropogênese”, que estuda a origem e o desenvolvimento da espécie humana, especialmente como objeto de investigação científica, verificou que, em seus processos produtivos, uma série de impactos e degradação ambiental tem sido gerada, recriando, aceleradamente, novos ambientes. Como consequência, paralelamente, pode ser estabelecida uma série de efeitos colaterais – EXTERNALIDADES, que poderão facilitar, dificultar ou mesmo impedir o desenvolvimento e a qualidade de vida dos seres humanos, à medida que alteram os ecossistemas. Para se discutir o papel e as contribuições da Economia Ambiental nesses dias atuais, devem-se conhecer a origem, entender como e quando esses problemas começaram a se agravar, e como tem sido árdua a busca por um novo modelo de produção e de desenvolvimento - é possível prosperidade sem crescimento?
            A partir dos anos da década de 1960, emerge a ideia da necessidade de uma nova postura relacionada aos procedimentos e usos dos recursos naturais. Já nos anos da década de 1980 surge o conceito de “desenvolvimento sustentável”, que revela, inicialmente, a crescente insatisfação com a situação criada e imposta pelo modelo de produção capitalista. Resulta de emergentes pressões sociais pelo estabelecimento de uma melhor distribuição de renda que permitisse maior equidade. Indica o desejo social de sistemas produtivos que, simultaneamente, conservem os recursos naturais e forneçam produtos mais saudáveis, sem comprometer os níveis tecnológicos já alcançados de segurança alimentar. Dessa forma, a proposta de implantação desse novo modelo deverá ser bem mais complexa do ponto de vista metodológico, demandando disponibilidade, aptidão e cooperação dos ensinamentos específicos, assumindo perspectivas interdisciplinares.
No campo da economia geral o objetivo do conhecimento é a investigação da origem, distribuição e emprego de bens escassos. Do ponto de vista ambiental é significativo considerar que neste processo é inerente o emprego de recursos naturais renováveis e não renováveis, devendo estar ciente, contudo, que ao lado de produtos úteis, são também gerados novos elementos e substâncias residuais nocivas ao ambiente, capazes de gerar poluição e degradação. Da mesma forma que na economia geral, na ciência econômica ambiental são incorporadas ciências naturais, conhecimentos técnicos, jurídicos, conhecimentos de ciências sociais e morais, na análise, formulação de conceitos e propostas de comportamento.
A proteção ambiental foi introduzida no ensino da economia e da economia empresarial a partir dos anos da década de 1970: inicialmente de forma hesitante; entretanto, nas últimas décadas, como uma forte tendência, em virtude da conscientização sobre o significado da escassez dos recursos naturais e das exigências do mercado em face de um novo tipo de consumidor. Como resultado, a variável ambiental passou a ser incluída na origem da exploração econômica e consequentemente, incorporada à teoria econômica. Isto significou avançar, não apenas sobre “inputs” que afetam preços de mercado, sobre objetivos tradicionais da produção ou sobre as relações de produção e consumo, mas também, sobre os processos de entrada (“input”), e processo de saída (“output”), como um todo. As reflexões sobre estas contribuições concentram-se na verdade sobre a teoria da produção, e por isto mesmo, de grande significado para a teoria econômica.
O processo de produção se fundamenta na mobilização de um conjunto de recursos denominados de fatores de produção que incluem recursos ambientais, recursos humanos, bens de produção, capital, capacidade tecnológica e empresarial. O capital natural (bens ambientais ou recursos naturais) constitui a base sobre a qual se exercem as atividades produtivas e encontra-se na origem de todo o processo de produção. Os bens ambientais cujo estoque e qualidade podem ser influenciados pela atividade econômica por meio do desgaste, sobrecarga ou melhoria ambiental são: a atmosfera, a superfície terrestre, o solo, o subsolo, a água e a biocenose (organismos vivos).
A conscientização relacionada ao limite da disponibilidade de bens ambientais para uma população demandante crescente levou a evolução da ciência econômica para uma nova abordagem - A ECONOMIA AMBIENTAL - pode ser definida como a ciência econômica que inclui a variável ambiental em suas teorias, análise e cálculos de custo. Em sua abrangência incorpora partes de uma economia política, bem como de uma economia industrial. Como parte importante da economia política, a ciência econômica ambiental incorpora a tarefa de desenvolver propostas que eleve a prosperidade social, por intermédio da maximização do bem-estar relacionado à elevada qualidade de vida. Algumas tarefas da economia ambiental estão ligadas à obtenção de princípios para que o processo produtivo consiga eliminar a separação entre economia e ambiente, tais como: a) alcançar um entendimento das exigências ambientais da economia e do crescimento econômico; b) reformar os indicadores econômicos para que incluam a variável ambiental; c) sugerir conceitos para uma economia ambiental; d) recomendar sistemas produtivos que não depredem o estoque de recursos ambientais; e e) desenvolver um modelo de produção que possua a filosofia exigida e adotada pelos Sistemas de Gestão Ambiental, particularmente aquelas da série ISO 14.000. Esta será necessariamente a evolução da ciência econômica no século 21.
Percebe-se que as empresas, as indústrias, as propriedades rurais e as diversas comunidades não estão aproveitando efetivamente os seus recursos, bem como o seu potencial de transformação dos produtos, da matéria-prima florestal e agroflorestal, e da administração de seus efluentes e resíduos gerados durante os processos produtivos, urbanos e rurais, em produtos de maior valor agregado. Fazem-se urgentes mudanças destes modelos de produção, sendo necessário: a) inicialmente, o conhecimento da História e dos fatores e principais atividades que geram degradação; b) a recuperação ambiental fundamentada na ética e dentro dos princípios do desenvolvimento sustentável; c) a elaboração de tecnologias apropriadas que poupem e conservem os recursos naturais; d) maior rigor na concessão do licenciamento ambiental, condicionando-o à adoção de sistemas de gestão ambiental (SGA) e incluindo, inclusive, a contabilidade ambiental e a valoração de passivos e ativos ambientais, bem como a avaliação de risco ambiental nos procedimentos diários das empresas; e) a efetividade no monitoramento e na fiscalização pelos órgãos responsáveis, com a participação de toda a sociedade, já politizada e ambientalmente educada; e f) a adoção de políticas públicas que favoreçam a internalização de externalidades positivas e a mitigação das externalidades negativas, como o estímulo à implantação dos SGA’s e a elaboração de projetos ambientais que não considere apenas as questões de ordem econômica mas, incondicionalmente, aquelas de ordem ambiental!
A gestão ambiental de um sistema tem por objetivo assegurar seu bom funcionamento e seu melhor rendimento, mas também sua perenidade e seu desenvolvimento. O SGA busca melhorar o desempenho ambiental e a operacionalização de uma organização, levando a empresa a adotar uma postura preventiva ao invés de corretiva. Dessa forma, são evitados os desperdícios, por meio da redução no uso de matéria-prima e da prática de reciclagem dos resíduos. Com essa medida, economizam-se recursos e a própria produção de resíduos, reduzindo os impactos negativos ao meio ambiente e gerando lucros para a empresa. Esse também deve ser o papel da Economia Ambiental, a partir da implementação de projetos que estimulem a prática de atividades sustentáveis.
Sugere-se mudança do atual modelo de produção, dada a visível insustentabilidade verificada até o presente momento. Atualmente, a adoção de Sistemas de Gestão Ambiental pelas empresas, urbanas e rurais, deve ser vista como uma prioridade - não apenas do ponto de vista de preservação ou conservação da natureza, mas como uma ferramenta de auxílio ao fortalecimento das Economias Geral e Ambiental.
Há de se considerar que projeto ambiental, na maioria das vezes possui enfoque social - é um conjunto de tarefas relacionadas entre si, com metas, orçamento e cronograma definidos, a priori, em parceria com os agentes interessados (instituição executora, financiadores, beneficiários, comunidade e sociedade), com a finalidade de alcançar um objetivo específico de desenvolvimento social ou humano, realizadas, geralmente, por organizações sem fins lucrativos.

* Engenheiro Agrônomo, Mestre em Recuperação de Áreas Degradadas e Economia e Gestão Ambiental e Doutor em Engenharia de Água e solo pela Universidade Federal de Viçosa. Foi professor do IF Sudeste de Minas campus Rio Pomba. Atualmente, IFES campus de Alegre. E-mail: mauriciosnovaes@yahoo.com.br.

Fonte: SOUZA, Maurício Novaes. INTRODUÇÃO à ECONOMIA AMBIENTAL. Apostila do Curso de Economia Ambiental. Belo Horizonte: Instituto de Educação Tecnológica (IETEC), 2006. 206p.


quarta-feira, 20 de setembro de 2017

Recuperação ambiental ou recuperação de áreas degradadas - Definições e objetivos


* Maurício Novaes Souza

Define-se área degradada ou ecossistema degradado, como aquele que, após distúrbio, teve: a) eliminados juntamente com a vegetação nativa, os seus meios de regeneração biótica como banco de sementes, banco de plântulas, chuva de sementes e órgãos ou partes que possibilitem a rebrota, inclusive com a perda da camada fértil do solo; b) a fauna destruída, removida ou expulsa; e c) a qualidade e regime de vazão do sistema hídrico alterados (CARPANEZZI et al., 1990; IBAMA, 1990).
Nessas condições, de acordo com essas mesmas fontes, por apresentar baixa resiliência, ocorre a degradação ambiental devido à perda de adaptação às características físicas, químicas e biológicas. Nesse caso, o seu retorno ao estado anterior pode não ocorrer ou ser extremamente lento, tornando necessária a ação antrópica para a recuperação desses ecossistemas e possibilitar o restabelecimento do desenvolvimento socioeconômico. Ecossistema perturbado, ou alterado, é aquele que sofreu distúrbio, mas manteve meios de regeneração biótica. A ação humana não é obrigatória, sendo necessário somente auxiliar na recuperação desse ambiente, pois a natureza pode se encarregar da tarefa. Em ecossistemas degradados, a ação antrópica para a recuperação quase sempre é necessária
Considerando que esses sistemas possuem energia armazenada, pode-se considerar que o ambiente degradado apresenta a perda dessa energia. BLUM (1998), identifica e sugere três tipos de energia envolvidos nesses compartimentos:

Ø  Gravitacional - é a energia que controla a maior parte de movimentos dos sólidos, líquidos e gases, sendo determinante para alguns fenômenos, tais como erosão e sedimentação;
Ø  Conservada - é a energia existente e presente no material de origem, sendo proveniente das forças internas da Terra, tais como pressão e temperatura; e
Ø  Solar - é a energia de maior importância para o crescimento e desenvolvimento das espécies vegetais. Por meio do processo de fotossíntese, os vegetais transformam o gás carbônico atmosférico em componentes orgânicos que são transferidos ao solo.

Considerando-se esse conceito, no qual as funções e uso do solo têm como base a sua energia armazenada, implica em dizer, que degradação do solo significa a perda de suas funções e usos. Dessa forma, a degradação ambiental pode ser definida nas formas específicas de energia. Assim, todas as atitudes a serem definidas na recuperação ou no uso de áreas degradadas, devem considerar o nível de energia no sistema (KOBIYAMA et al., 2001).
Observa-se, entretanto, na maioria dos conceitos relacionados à área degradada, a priorização em relacioná-la ao fator solo ou terra. Sabe-se, porém, que ela engloba não apenas o solo, mas também a água, o ar e os organismos. Sob esta visão, KOBIYAMA et al. (1993) definiram degradação, como “processos e fenômenos do meio ambiente, naturais ou antropogênicos1, que prejudicam as atividades de um ou mais organismos”. A partir dessa definição, conceituaram área degradada considerando a sua entropia (S), que pode ser definida como a divisão entre calor (Q) e temperatura (T), ou seja, dS = dQ/T. Entendem, assim, que entropia representa a “sujeira” no sistema, resultando na desarmonia dos processos envolvidos. Dentro dessa visão, área degradada é aquela que apresenta maior entropia do que um ambiente equilibrado.
Para ODUM (1988), entropia é a medida da energia não disponível que resulta das transformações, como nos processos de dispersão, havendo queda de qualidade, posto não ocorrer tais processos, mesmo espontâneos, sem a ocorrência de perdas. Então, quanto menor a entropia (relação percentual entre a energia dissipada sem aproveitamento e a total utilizada), maior é a eficiência do processo de transformação.
Tratando-se da recuperação propriamente dita, é comum a citação de termos como recuperação, reabilitação e restauração como se fossem um único processo. TOY e DANIELS (1998) definem três categorias de tratamento de recuperação de solo:

Reabilitação - o solo é retornado à forma e produtividade em conformidade com a sua capacidade de uso, incluindo sua estabilidade e equilíbrio ecológico, que não contribua substancialmente para a deterioração ambiental e com os valores estéticos circundantes;

Recuperação - o local é novamente hospitaleiro para organismos que eram originalmente presentes ou outros que se aproximam das populações originais; e

Restauração - a condição do local no momento da perturbação é reproduzida depois da ação.

Estes mesmos autores comentam que os termos reabilitação, recuperação e restauração não foram uniformemente usados, sendo que outras denominações variaram ao longo dos anos. As leis e regulamentos pertinentes foram interpretados e cumpridos de diferentes modos, variando de acordo com o tempo e com o lugar. Atualmente, o termo “recuperação” é o que vem sendo mais utilizado no Brasil, mas com o entendimento que possibilidades alternativas de usos do solo, devem permanecer.
De acordo com GRIFFITH et al. (2000), “a recuperação de áreas degradadas (RAD), ou recuperação ambiental (RA), é um conjunto de ações planejadas e executadas por especialistas de diferentes áreas do conhecimento humano, que visam proporcionar o restabelecimento da auto sustentabilidade e do equilíbrio paisagístico semelhantes aos anteriormente existentes, em um sistema natural que perdeu essas características. As pesquisas em recuperação ambiental têm enfocado tanto os problemas decorrentes das atividades agropecuárias, florestais, minerárias, construção civil, urbanização e industrialização, como aqueles decorrentes de processos naturais, tais como enchentes, incêndios, secas, dilúvios e atividades sísmicas”.
Neste artigo, recuperação ambiental é definida como o tratamento de áreas perturbadas para criar pedopaisagens estáveis e condições edáficas para se sustentarem, mediante uso do solo em sua condição predeterminante, exigindo condições mínimas de manutenção. Além disso, as comunidades existentes no local recuperado, deverão conviver com essa nova paisagem em harmonia, dentro de uma nova realidade socioeconômica, onde haja maior equidade social: ou seja, propõe-se a recuperação socioambiental, que garantirá, de fato, a auto sustentabilidade do ambiente.

NOTA:

1.     No sentido de «relativo à ação do homem sobre o ambiente» (dicionário da Porto Editora), recomenda-se antrópico (como em «processos antrópicos»; cf. dicionário da Priberam). Embora antropogênico seja empregado frequentemente com o mesmo significado, a sua constituição remete para antropogénese, «estudo da origem e do desenvolvimento da espécie humana, especialmente como objeto de investigação científica» (Dicionário Houaiss), e, portanto, deve ser reservado para fazer referência a este tipo de estudo.

* Engenheiro Agrônomo, Mestre em Recuperação de Áreas Degradadas e Economia e Gestão Ambiental e Doutor em Engenharia de Água e solo pela Universidade Federal de Viçosa. Foi professor do IF Sudeste de Minas campus Rio Pomba. Atualmente, IFES campus de Alegre. E-mail: mauriciosnovaes@yahoo.com.br.


Fonte: SOUZA, Maurício Novaes. Degradação e Recuperação Ambiental e Desenvolvimento Sustentável. Viçosa, MG: UFV, 2004. 371p. Dissertação (Mestrado em Ciência Florestal) - Universidade Federal de Viçosa, 2004.

quinta-feira, 14 de setembro de 2017

Nova denúncia contra Temer - como ninguém fala nada, nada acontecerá!


* Maurício Novaes Souza

O procurador-geral da República, Rodrigo Janot, ofereceu hoje, quinta-feira, 14-09-2017, nova denúncia contra o presidente Temer, pelos crimes de obstrução de Justiça e organização criminosa. Também, foram denunciados por organização criminosa os ministros do PMDB Eliseu Padilha (Casa Civil) e Moreira Franco (Secretaria-Geral); os ex-ministros do PMDB Geddel Vieira Lima (Secretaria de Governo) e Henrique Eduardo Alves (Turismo); e o ex-deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ). Além disso, assim como Temer, foram denunciados por obstrução de Justiça os executivos do grupo J&F Joesley Batista e Ricardo Saud, cujos acordos de delação foram rescindidos pela Procuradoria Geral da República (PGR). Lembram-se que o presidente em pronunciamento, em cadeia nacional, ano passado, afirmou que caso houvesse denúncia, só assim, seus ministros seriam afastados? Pois bem: hoje, ele resolveu que não!
Tempos sombrios os atuais! Vejam bem: todos os acima citados, mesmo com todas as evidências, negam peremptoriamente! Temer, atolado em denúncias de corrupção desde a delação do empresário Joesley Batista, tenta sobreviver na presidência, contra a vontade do povo brasileiro: será? Ninguém fala nada, e nada acontece! É quase inacreditável todo o conteúdo da nova denúncia. De fato, é uma organização criminosa! Pensem bem: estamos sendo governados por uma organização criminosa!!! Mas, o Brasil é surreal: por incrível que possa parecer, a economia está descolada desse cenário político caótico e semelha decolar! Parece que vivemos em dois Brasis, onde não conseguimos obter respostas para muitos de nossos questionamentos.
Feita a denúncia, qual foi o movimento da sociedade? E qual foi a repercussão no meio político? Vejamos algumas - o deputado federal Alessandro Molon (Rede-RJ) disse ao Globo.com: "É uma denúncia extremamente grave, que mostra que na cadeira da Presidência da República está sentado o chefe de uma organização criminosa que ordenou a compra do silêncio do operador financeiro desta organização criminosa. Temer fez tudo isso para que os crimes dele ficassem ocultos à Justiça e diante da gravidade desses fatos é inaceitável que a Câmara, mais uma vez, impeça a Justiça de julgar Temer pelos crimes que ele cometeu".
O Senador Álvaro Dias (PR), líder do Pode no Senado, reforçou: "É uma denúncia fulminante que tem força jurídica, especialmente, em função das provas acumuladas em várias delações. Certamente, a Câmara terá enorme dificuldade na apreciação dessa nova denúncia. A imagem do presidente está fragilizada diante da sociedade e do Congresso. Certamente, custará caro ao país a manutenção do seu mandato. Eu creio que os episódios que envolvem os delatores foram concluídos com a prisão deles, as providências foram tomadas, de forma alguma, esses fatos [as reviravoltas nas delações] comprometem a denúncia. Ao contrário, eu creio que a denúncia ganha força".
Por outro lado, Beto Mansur (PRB-SP), deputado e vice-líder do governo na Câmara, comenta: "Entendemos que o procurador não pode formular uma denúncia com base em uma gravação que está sendo investigada. Esse processo tem que ficar paralisado até que a própria Procuradoria tire essas dúvidas. Se o Supremo, na próxima semana, entender que temos que dar continuidade a essa denúncia, vamos dar um trâmite rápido na Câmara. Estamos vivendo uma época de muito 'denuncismo' no Brasil. Quem faz delação pode acusar até a própria mãe." E o surpreendente Carlos Marun (PMDB-MS), deputado e vice-líder do PMDB na Câmara, amigo do Temer, afirma: "A denúncia apresentada, se efetivamente for baseada no áudio já conhecido e que não diz nada ou na palavra de Funaro, tratar-se-á de uma denúncia fraca. E, nesse momento, a apresentação de uma denúncia fraca se constitui uma irresponsabilidade grave e inconsequente. ”
Friamente, pensemos no momento vivido, no número de provas existentes, inclusive gravações, filmagens, depoimentos, que não deixam dúvida sobre os fatos, mesmo assim, provavelmente, dados os vieses dos depoimentos acima, Temer permanecerá no cargo até o final de 2018! É inconcebível! É inadmissível! Alguns deputados estão dizendo que a denúncia é sem consistência: como? Em qualquer país, mais ou menos sério, para tais denúncias, em sã consciência, nenhum tipo de recurso ou discussão caberiam! Que políticos são esses?  Que justiça é essa? De fato, a democracia está sendo seriamente atacada!
Cláudio Lamacchia, presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), sentencia: "A segunda denúncia contra o presidente da República, Michel Temer, que acaba de ser enviada pela Procuradoria Geral da República ao Supremo Tribunal Federal, é gravíssima. Acusa-o de formar a liderar uma quadrilha integrada pela cúpula de seu partido, o PMDB, de que fazem parte alguns ministros de Estado. Teriam lesado os cofres de diversos órgãos estatais. Jamais a República brasileira testemunhou crise de tais proporções. No entanto, as instituições do Estado têm se mostrado rígidas e atentas no cumprimento de suas missões. É preciso investigar e cumprir todas as etapas previstas na liturgia jurídica, garantindo o contraditório e a ampla defesa, sem protelações ou atalhos, evitando que se incorra em graves infrações legais. Não é hora de estardalhaços, nem de tentativas de explorar politicamente o quadro. Mais do que nunca, a regularidade institucional precisa ser garantida pelo bom senso, lisura e serenidade. Não há outro caminho para que o país supere a crise e dela saia mais fortalecido: só pela lei. Fora dela, não há salvação."
Ou seja: de fato, vivemos um momento de declínio da política e de parte das instituições brasileiras. O Congresso foi capturado pelo poder econômico, não mais preocupado em se reeleger, mas em realizar seus lucros neste mandato. A reforma política não sairá e tudo continuará como está? E o STF? Nenhuma atitude efetiva? Ou seja, como dizia um de seus antigos membros, Joaquim Barbosa, nos causam espécie! Agindo assim, observa-se que o STF não se tornou apenas politizado, mas está partidarizado. O Executivo, não tem mais resquícios morais: é o triste retrato esquizofrênico, exacerbado, da situação nacional.
Ao longo do dia os depoimentos continuaram, como o do Senador Paulo Bauer (SC), líder do PSDB no Senado: "O procedimento do Janot de apresentar essa denúncia a 2 dias da saída do cargo tem um grau de açodamento, e tem uma característica que deve ser questionada. Não terá como ele acompanhar o desenvolvimento do assunto e nem o seu andamento. Deixa dúvidas sobre a sua confiança na instituição que preside. Se os fatos existem, se há fundamentação, ele deveria muito tranquilamente considerar que a sucessora dele tomasse a mesma providência que ele tomou. Eu considero que hoje, o Janot como PGR já não tem a mesma credibilidade e a mesma condição que tinha em um outro momento, por ele ter tanta pressa para fazer as coisas".
Pressa? Com todos esses acontecimentos, e vários outros ao longo do dia, como as investigações ao Ministro Blairo Maggi, não deveriam aparecer decisões exemplares? O PMDB, partido de Temer e dos denunciados, fez a seguinte nota: "O PMDB lamenta mais um ato de irresponsabilidade realizado pelo procurador-geral da República, Rodrigo Janot. Toda a sociedade tem acompanhado os atos nada republicanos das montagens dessas delações. A justiça e sociedade saberão identificar as reais motivações do procurador."
O fato é a sociedade vive uma depressão coletiva! Nós, brasileiros, tanto a direita e a esquerda, não temos nada a comemorar. Nossas teses, nossos projetos, desfazem-se a cada dia, com o fracasso do governo Temer e com os escândalos de corrupção. A violência cometida contra a população brasileira neste momento, não tem precedentes na história republicana. E o que me espanta mais ainda: não há político ou partido algum nesse momento, que consiga mobilizar a população. Sem dúvida alguma, ocorreu a deterioração da política brasileira e, infelizmente, a sociedade não consegue mais se organizar!


* Engenheiro Agrônomo, Mestre em Recuperação de Áreas Degradadas e Economia e Gestão Ambiental e Doutor em Engenharia de Água e solo pela Universidade Federal de Viçosa. Foi professor do IF Sudeste de Minas campus Rio Pomba. Atualmente, IFES campus de Alegre. E-mail: mauriciosnovaes@yahoo.com.br.

sexta-feira, 8 de setembro de 2017

Governo Temer patrocina o retrocesso ambiental


*Maurício Novaes Souza

Retrocesso significa o ato de retroceder, andar para trás, recuar! Com a decisão do governo de acabar com a Reserva Nacional de Cobre e Associados (RENCA) na Amazônia, ao permitir a mineração na área, pode-se afirmar que o retrocesso ambiental do governo Temer é evidente! Agrava-se a situação pelo fato de que existe uma percepção difusa por parte da sociedade: minerar e gerar empregos naquela região pode significar “progresso e desenvolvimento”.
O território liberado para exploração de atividades minerárias na RENCA é do tamanho do Estado do Espírito Santo. Mesmo que o governo fiscalize as empresas autorizadas a operar as minas, argumento usado pelo governo, não será possível acompanhar os grileiros, aventureiros, garimpeiros e outros grupos que vão se instalar no que antes era uma reserva ambiental. Para a WWF, a liberação de área protegida na Amazônia é um movimento muito perigoso. De acordo com o seu coordenador no Brasil, a corrida pela exploração pode gerar conflitos na região. Para ele, a extinção da reserva ocorreu de forma açodada, sem discussão. Neste momento de desespero e de crise, estão colocando em risco as áreas protegidas que se encontram dentro da reserva. A questão se agrava quando o governo toma tal decisão por decreto, sem discutir com a sociedade. Por que isso não foi feito via projeto de lei, que exige audiência pública? Todos sabem a importância da mineração para a economia brasileira, mas é preciso saber o risco envolvido.
No Brasil, temos vários exemplos de contaminação mineral - um rio contaminado coloca em risco os povos da floresta que vivem do consumo de peixe. No caso da extinção da RENCA, é possível que se perpetuem a mineração em pequena escala, em garimpos, como grandes grupos internacionais. Como garantir que as grandes empresas de mineração sigam acordos de cooperação dos quais o Brasil não é signatário? Esses acordos preveem regras mais modernas de exploração. Mas como saber se as empresas vão cumprir no Brasil regras que seguem em seus países de origem? Há sempre o risco de tragédias como a de Mariana que afetaram drasticamente o rio Doce!
As manifestações populares foram intensas a partir dessa decisão governamental de extinção da RENCA. Encabeçada pelo Ministério Público Federal (MPF), uma mobilização contra o que os participantes classificam como o “avanço do retrocesso ambiental” ganhou as redes sociais, ganhando a adesão de milhares de internautas, entre eles integrantes da força-tarefa da Operação Lava Jato e da modelo Gisele Bündchen. Contrário às medidas, o MPF convidou membros dos ministérios públicos estaduais, de ONGs como Greenpeace e WWF a se manifestarem no Twitter. Apenas o MPF publicou mais de 50 comentários críticos às mudanças nas leis em sua página oficial no Twitter. Procuradorias federais de vários estados também aderiram à campanha. Para o coordenador da força-tarefa da Operação Lava Jato, Deltan Dallagnol, a eventual aprovação da Lei Geral de Licenciamento Ambiental (PL 3.729), em discussão na Câmara, enfraquecerá o processo de licenciamento ambiental.
Para o El País, o Congresso quer votar medidas que ampliarão o desmatamento. Além disso, as propostas de redução dos direitos sociais dominam a pauta do atual governo, que a cada dia mais se afunda pelas investigações de corrupção e pela crise, gerando outras propostas apressadas. O Brasil caminhava, principalmente de 2003 a 2009, para cumprir a Meta 11 das “Metas de Aichi”, acertadas no âmbito da Convenção sobre Diversidade Biológica, consistente na proteção, até 2020, de pelo menos 17% de áreas terrestres e de águas continentais e 10% de áreas marinhas e costeiras. Entre 2005 e 2012, o país foi um dos que mais contribuiu para a mitigação das mudanças climáticas, resultado obtido também pela criação de unidades de conservação, com o desmatamento, que chegou a 27.000 km² em 2004, baixando para 4.500 k em 2012. Foi nesses termos que, na Conferência do Clima em Paris (COP 21), o Brasil se comprometeu a zerar o desmatamento ilegal na Amazônia brasileira até 2030 e a reduzir as emissões de gases de efeito estufa em 37% até 2025 e em 43% até 2030, tendo como referência os níveis de 2005.
Para Leandro Mitidieri, Procurador da República, quando ainda se lutava pela consolidação dessa nova atitude e pela efetivação do arcabouço de unidades de conservação existentes, surge um ataque, nunca antes visto, ao que foi duramente alcançado, com um pacote de medidas provisórias e propostas legislativas de redução e extinção de várias dessas áreas protegidas, inclusive na Mata Atlântica. Apesar da Constituição exigir lei formal para a supressão de unidades de conservação, adotou-se o regime de urgência das medidas provisórias para esse ataque, ao invés de um processo cuidadoso e amparado em estudos técnicos. Há de se considerar, ainda, o fato de que o já combalido Ministério do Meio Ambiente sofreu redução de 53% no seu orçamento para 2017.
Será que vamos regredir para o estágio em que se acreditava que os recursos naturais eram ilimitados? Talvez não seja prudente para os próprios produtores duvidarem, por exemplo, que a floresta amazônica exporta rios aéreos de vapor para irrigar regiões distantes no verão hemisférico, fazendo dela valiosa parceira das atividades humanas que requerem chuva no momento necessário, um clima ameno e proteção de eventos climáticos extremos. É sabido que é possível produzir e reduzir o desmatamento: alcançou sua maior redução, de 2005 a 2012, simultaneamente a um período de saltos extraordinários da produção agropecuária brasileira. Entretanto, em operações como a recente “Carne Fria”, identificaram-se empresas que vêm comprando gado de áreas desmatadas ilegalmente - indicam que a sanha do agronegócio avança incontrolável nos dias atuais, agravando a situação ambiental na região amazônica, com aval do atual governo.


* Engenheiro Agrônomo, Mestre em Recuperação de Áreas Degradadas e Gestão Ambiental e Doutor em Engenharia de Água e Solo pela Universidade Federal de Viçosa. Foi professor do IF Sudeste de Minas campus Rio Pomba. Atualmente, IFES campus de Alegre. E-mail: mauricios.novaes@ifes.edu.br.

É visível o retrocesso ambiental nos dias do Governo Temer

*Maurício Novaes Souza

"Pedimos o abandono total e definitivo da PL 8.107/17. Exigimos também que ouçam o apelo do povo brasileiro e parem, de uma vez por todas, de passar leis, decretos e qualquer outra medida legislativa irresponsável para agradar interesses da bancada ruralista e outros poderosos. Esse abuso gera o desmate e destruição irreversível da floresta Amazônica, patrimônio da humanidade das gerações atuais e futuras."

O trecho acima em destaque é um grito desesperado da ONG internacional AVAAZ! Míriam Leitão, em seu blog, pergunta: o país não aprendeu nada com a tragédia de Mariana? Pois vejamos: retrocesso significa o ato de retroceder, andar para trás, recuar! A decisão do governo de acabar com a Reserva Nacional de Cobre e Associados (RENCA) na Amazônia, ao permitir a mineração na área, levanta essa dúvida e já se pode afirmar - o retrocesso ambiental do governo Temer é cada vez maior! Agrava-se a situação pelo fato que existe uma percepção difusa por parte da sociedade: nem sempre é fácil verificar se algo ou alguém retrocedeu, posto que tal questão pode ser altamente subjetiva! Para alguns, minerar e gerar empregos naquela região pode significar “progresso e desenvolvimento”.
O território liberado para exploração de atividades minerárias na RENCA é do tamanho do meu Estado, o Espírito Santo, com uma extensão equivalente à da Dinamarca. Mesmo que o governo fiscalize as empresas autorizadas a operar as minas, argumento usado pelo governo, não será possível acompanhar os grileiros, aventureiros, garimpeiros e outros grupos que vão se instalar no que antes era uma reserva ambiental; ou seja, avançará a destruição. Nessa área, em plena Amazônia, há cinco reservas de proteção integral, inclusive, duas reservas indígenas: nenhuma atividade pode ser desenvolvida; e quatro áreas de exploração sustentável, que exige plano de manejo. De fato, esse é mais um retrocesso do governo Temer na questão ambiental - a decisão de encerrar a reserva foi tomada por decreto, sem discussão. É preciso lembrar da tragédia do rio Doce (Mariana/SAMARCO), que nos deixou lições: a mineração tem que ser muito bem controlada, posto que traz impactos irreversíveis.
Como anda a legislação ambiental no Brasil? De acordo com Marcos Saes, da SAES.ADVOGADOS, a causa de existência do Poder Legislativo é justamente a de fazer leis. Mas não só isso, é também de adequá-las ao momento vivido pela sociedade. Justamente por isso, no ano de 2012, após inúmeras discussões havidas nas Casas Legislativas e em quase cem Audiências Públicas, veio o Novo Código Florestal, em substituição ao anterior (1965). Ocorre que a Procuradoria Geral da República e o Partido Socialismo e Liberdade (PSOL) propuseram quatro Ações Diretas de Inconstitucionalidade (ADIs) em face do chamado Novo Código Florestal (Lei n. 12.651/2012). Baseiam as suas ações no chamado princípio da proibição do retrocesso. Na visão desse autor, esse princípio teria sido recepcionado pela Constituição Federal de 1988 e a sua aplicação simplesmente proibiria toda e qualquer alteração legislativa que traga retrocessos à proteção ao meio ambiente. Tal princípio teve origem na Europa e visava a defender conquistas sociais. Com o passar do tempo, segundo esse mesmo autor, começou-se a defender a sua aplicabilidade também para as questões relacionadas ao meio ambiente.
A partir desse contexto é que doutrinadores brasileiros passaram a argumentar sua aplicação no direito brasileiro. Contudo, para SAES, trazer tal lição para o mundo ambiental, criar-se-iam inúmeras situações paradoxais, que poderiam ser um retrocesso aos processos de modernização dos dias atuais - importante destacar que nossa Constituição defende tanto o meio ambiente quanto a livre iniciativa (típica visão liberal). Dessa forma, as normas que regram a utilização sustentável dos recursos naturais devem, constantemente, ser reavaliadas por quem possui atribuição e competência para tanto. Nada mais normal e saudável, para que não haja ações questionando outras alterações legislativas que versem sobre questões ambientais, engessando a evolução legislativa e criando uma total insegurança jurídica. Vedar toda e qualquer alteração legislativa que, à primeira vista, indique disposição menos restritiva em matéria de direitos sociais ou meio ambiente, significa obstar o desenvolvimento natural das sociedades, desfigurando o real intuito perquirido com a defesa do princípio da proibição do retrocesso e tornando-se assim, talvez, esse intuito um verdadeiro retrocesso social. Ou seja, observamos na fala desse autor, uma visão tipicamente “desenvolvimentista”.
Para a WWF, em entrevista à oglobo.com, a liberação de área protegida na Amazônia é um movimento muito perigoso. De acordo com o seu coordenador no Brasil, Michel de Souza, a corrida pela exploração pode gerar conflitos na região. Para ele, a extinção da reserva de forma açodada, sem discussão, é muito perigosa. Neste momento de desespero e de crise, estão colocando em risco as áreas protegidas que se encontram dentro da reserva. A questão se agrava quando o governo toma tal decisão por decreto, sem discutir com a sociedade. Por que um decreto? Por que isso não foi feito via projeto de lei, que exige audiência pública? Todos sabem a importância da mineração para a economia brasileira, mas é preciso saber o risco envolvido. Especialmente no momento em que se tenta, também, enfraquecer as regras de licenciamento ambiental. A corrida pela exploração pode gerar conflitos na região: como garantir que mesmo a exploração fora das áreas protegidas não traga consequências para o ambiente?
A decisão é uma catástrofe anunciada. No Brasil, temos vários exemplos de contaminação mineral - um rio contaminado coloca em risco os povos da floresta que vivem do consumo de peixe. Além do mais, é possível que se perpetuem a mineração em pequena escala, em garimpos, como grandes grupos internacionais. Como garantir que as grandes empresas de mineração sigam acordos de cooperação dos quais o Brasil não é signatário? Esses acordos preveem regras mais modernas de exploração: sabemos do altíssimo impacto ambiental negativo da atividade de mineração. Mas como saber se as empresas vão cumprir no Brasil regras que seguem em seus países de origem? Há sempre o risco de tragédias como a de Mariana que afetaram drasticamente o rio Doce!
As manifestações populares foram intensas a partir dessa decisão governamental. Segundo Alex Rodrigues, Repórter da Agência Brasil, encabeçada pelo Ministério Público Federal (MPF), uma mobilização contra o que os participantes classificam como o “avanço do retrocesso ambiental” ganhou as redes sociais, ganhando a adesão de milhares de internautas, entre eles integrantes da força-tarefa da Operação Lava Jato e da modelo Gisele Bündchen, embaixadora da Boa Vontade do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA). O principal alvo de tal mobilização foram duas medidas provisórias que alteram as dimensões de unidades de conservação ambiental. As medidas provisórias 756 e 758, ambas de 2016, foram aprovadas pela Câmara dos Deputados, no dia 16 de maio, e pelo Senado, no dia 24. Segundo o MPF, a hashtag #retrocessoambientalnao chegou a ocupar, por cerca de uma hora, o quarto lugar entre os temas mais comentados por brasileiros no Twitter, alcançando, em cinco horas, mais de 10 milhões de impressões (número de vezes que um tweet foi veiculado na timeline ou nos resultados de busca).
A MP 756 altera os limites do Parque Nacional do Rio Novo, localizado nos municípios paraenses de Itaituba e Novo Progresso, e da Floresta Nacional (Flona) do Jamanxim, também em Novo Progresso; a MP 758 modifica os limites do Parque Nacional do Jamanxim, em Itaituba e Trairão, no Pará, e da Área de Proteção Ambiental do Tapajós. Os textos, aprovados pela Câmara e pelo Senado, aguardam a sanção presidencial. Entre outros pontos, os textos aprovados permitem ao governo realocar, em terras disponíveis da União ou do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), na Amazônia Legal, os ocupantes de áreas rurais dentro da Floresta Nacional do Jamanxim e do Parque Nacional do Rio Novo. Até assumir a posse das novas áreas, os ocupantes poderão continuar a exercer suas atividades econômicas. Os imóveis rurais privados existentes no interior do Parque Nacional do Jamanxim passam a ser declarados de utilidade pública para fins de desapropriação pelo Instituto Chico Mendes.
Contrário às medidas, o MPF convidou membros dos ministérios públicos estaduais, de ONGs como Greenpeace e WWF a se manifestarem no Twitter. Só o MPF publicou mais de 50 comentários críticos às mudanças nas leis em sua página oficial no Twitter. Procuradorias federais de vários estados também aderiram à campanha. O coordenador da força-tarefa da Operação Lava Jato, Deltan Dallagnol, foi um dos procuradores que usaram sua conta pessoal no microblog para criticar a aprovação das MPs 756 e 758 e o teor de outras propostas em análise no Congresso. Para Dallagnol, a eventual aprovação da Lei Geral de Licenciamento Ambiental (PL 3.729), em discussão na Câmara, enfraquecerá o processo de licenciamento ambiental. O procurador defende que, depois do rompimento da Barragem de Fundão, que liberou no ambiente mais de 60 milhões de metros cúbicos de rejeitos de uma barragem da mineradora Samarco, as regras do licenciamento ambiental “deveriam ser mais rigorosas, e não mais frágeis”. Na avaliação do Instituto Socioambiental (ISA), se sancionadas, as duas medidas provisórias vão “mutilar” as unidades de conservação paraenses, liberando cerca de 598 mil hectares de áreas de proteção da flora e da fauna em benefício de desmatadores, grileiros, garimpeiros e do agronegócio. A Câmara de Meio Ambiente e Patrimônio Cultural do MPF teme que, se forem sancionadas conforme o texto aprovado pelo Congresso, as duas MPs colocarão em risco 2,2 milhões de hectares protegidos não só no Pará, mas também no Amazonas.
Por outro lado, quando a MP  756 foi aprovada na Câmara, o deputado Alceu Moreira (PMDB-RS) disse que a medida pode ajudar a resolver problemas de extração ilegal de madeira, grilagem de terras e garimpo na região do Parque Nacional do Rio Novo e no Parque Nacional do Jamanxim e estabelecer um “convívio harmônico e solidário entre o social, o ambiental e o econômico”. A MP 758 altera área de proteção ambiental para dar passagem à Estrada de Ferro (EF)170, também chamada de Ferrogrão, que está em fase de construção próxima à BR-163, no Pará. Segundo o governo, a intenção é compor, com a EF-170, um corredor de exportação de grãos unindo Sinop (MT) a Miritituba (PA) para possibilitar o uso de portos da Bacia Amazônica e servir de alternativa ao transporte na BR-163.Os dois textos foram votados e aprovados no Senado sem alterações, mas durante as votações, nas duas Casas, houve protesto e obstrução por parte de parlamentares da oposição.
Para o El País, o Congresso quer votar medidas que ampliarão o desmatamento. Além disso, as propostas de redução dos direitos sociais dominam a pauta do atual governo, que a cada dia mais se afunda pelas investigações de corrupção e pela crise, gerando outras propostas apressadas. O Brasil caminhava, principalmente de 2003 a 2009, para cumprir a Meta 11 das “Metas de Aichi”, acertadas no âmbito da Convenção sobre Diversidade Biológica, consistente na proteção, até 2020, de pelo menos 17% de áreas terrestres e de águas continentais e 10% de áreas marinhas e costeiras. Entre 2005 e 2012, o país foi um dos que mais contribuiu para a mitigação das mudanças climáticas, resultado obtido também pela criação de unidades de conservação, com o desmatamento, que chegou a 27.000 km² em 2004, baixando para 4.500 k em 2012. Foi nesses termos que, na Conferência do Clima em Paris (COP 21), o Brasil se comprometeu a zerar o desmatamento ilegal na Amazônia brasileira até 2030 e a reduzir as emissões de gases de efeito estufa em 37% até 2025 e em 43% até 2030, tendo como referência os níveis de 2005.
Para Leandro Mitidieri, Procurador da República, quando ainda se lutava pela consolidação dessa nova atitude e pela efetivação do arcabouço de unidades de conservação existentes, surge um ataque, nunca antes visto, ao que foi duramente alcançado, com um pacote de medidas provisórias e propostas legislativas de redução e extinção de várias dessas áreas protegidas, inclusive na Mata Atlântica. Segundo esse mesmo autor, apesar da Constituição exigir lei formal para a supressão de unidades de conservação, adotou-se o regime de urgência das medidas provisórias para esse ataque, ao invés de um processo cuidadoso e amparado em estudos técnicos. Há de se considerar, ainda, o fato de que o já combalido Ministério do Meio Ambiente sofreu a assustadora redução de 53% no seu orçamento para 2017 e que o licenciamento ambiental vem sendo dilacerado.
O fato é que nossos tribunais já vêm admitindo o princípio de que é proibido o retrocesso social e ambiental, exceto se ele tem amparo na Constituição. Nesses tempos de pós-verdade, em que se sustenta que desenvolvemos a razão como uma arma para vencer discussões, e não para buscar a verdade, haverá sempre argumentos contra estudos que apontam a relação do aumento da febre amarela com o desmatamento, contra a tese de que a floresta Amazônica evita furacões e outros eventos climáticos extremos ou, ainda, contra teorias como a da “ecologia do medo”, que explica como a ausência de predadores faz com que as presas se comportem de forma mais danosa ao meio ambiente, alimentando-se tranquilamente da mata ciliar, por exemplo.
Será que vamos regredir para o estágio em que se acreditava que os recursos naturais eram ilimitados? Inesgotáveis? Talvez não seja prudente para os próprios produtores duvidarem de que, por exemplo, a floresta amazônica exporta rios aéreos de vapor para irrigar regiões distantes no verão hemisférico, fazendo dela valiosa parceira das atividades humanas que requerem chuva no momento necessário, um clima ameno e proteção de eventos climáticos extremos. É sabido que é possível produzir e reduzir o desmatamento: alcançou sua maior redução, de 2005 a 2012, simultaneamente a um período de saltos extraordinários da produção agropecuária brasileira. Entretanto, em operações como a recente “Carne Fria”, identificaram-se empresas que vêm comprando gado de áreas desmatadas ilegalmente - indicam que a sanha do agronegócio avança incontrolável nos dias atuais, agravando a situação ambiental na região amazônica.

* Engenheiro Agrônomo, Mestre em Recuperação de Áreas Degradadas e Gestão Ambiental e Doutor em Engenharia de Água e Solo pela Universidade Federal de Viçosa. Foi professor do IF Sudeste de Minas campus Rio Pomba. Atualmente, IFES campus de Alegre.

E-mail: mauricios.novaes@ifes.edu.br.



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