* Maurício Novaes Souza
Em 2018 foi registrado aumento de 22% do
desmatamento em todo território da floresta amazônica, ao contrário de 2017, quando
houve uma redução de 21%. De acordo com o g1.globo.com, divulgando o Relatório
do Instituto do Homem e Meio Ambiente da
Amazônia (Imazon), o Pará é o estado com
maior índice de desmatamento da Amazônia Legal, tendo como agravante o fato que
52% das áreas atingidas são de preservação ambiental – 2.441 km² de área desmatada entre agosto de 2017 e
maio de 2.018, 852 km². Em maio de 2018, 48% do total desmatado foi no Pará,
seguido pelo Mato Grosso (29%); Amazonas (15%); Rondônia (7%); e Acre (1%). De
acordo com o pesquisador do Imazon Antonio Vítor, dois fatores podem ter
provocado o aumento do desmatamento: a) a recuperação do setor pecuário, já que
a maioria das áreas desmatadas viram pastos; e b) a proximidade das eleições. "Historicamente, a gente observa que em anos eleitorais ocorre esse
aumento na região, o que pode estar muito atrelado à incertezas na agenda ambiental".
Segundo o Imazon, a incerteza sobre a questão ambiental acaba
transmitindo a sensação de impunidade. O ICMBIO, órgão Federal responsável pela
fiscalização, informou que entre as diversas ações realizadas no controle de
desmatamento nas unidades de conservação federais, destaca-se a operação
Integração, deflagrada em 2018, que abrange nove frentes em 25 unidades de
conservações federais. O Ministério do Meio Ambiente foi contatado pela
reportagem e não respondeu sobre o pedido; contudo, em entrevista televisiva,
ele discorda dos dados da Imazon!
A importante ONG ambiental WWF, produziu um documento-base
que representa a contribuição do WWF-Brasil em fundamentos e subsídios para o
debate no período que antecede as eleições de 2018. O conteúdo resulta de uma
série de entrevistas com os líderes de cada tema do WWF-Brasil, que deram os
elementos iniciais para a elaboração das proposições. Em 2018, o Brasil tem, no
encontro com as urnas, uma oportunidade de fazer escolhas. Estão em jogo não
apenas o destino de milhões de brasileiros, mas as condições de vida das futuras
gerações. Os eleitores não irão escolher apenas os governantes e legisladores,
mas sobretudo um modelo de desenvolvimento que deve permear as discussões
durante a campanha eleitoral. Para isso, a WWF-Brasil oferece alguns elementos.
Ao avaliar as propostas dos candidatos, é preciso ter em mente que o Brasil, em
conjunto com os demais países reunidos na Convenção do Clima das Nações Unidas,
já assumiu compromissos no sentido de reduzir as emissões de gases de efeito
estufa. Em 2016, ano seguinte à assinatura do Acordo de Paris e em plena
recessão econômica, o Brasil caminhou na contramão e registrou aumento de 8,9%
das emissões.
O avanço do desmatamento da Amazônia foi a
principal causa apontada pelo Sistema de Estimativas de Emissões de Gases de
Efeito Estufa (SEEG). As emissões decorrentes de mudança do uso da terra foram
responsáveis por metade de todos os gases de efeito estufa lançados na
atmosfera no ano passado. O desmatamento e a agricultura são dois dos temas
tratados neste documento, que, em seu conjunto, reafirma a defesa de um modelo
de desenvolvimento socialmente inclusivo e ambientalmente responsável, alinhado
a compromissos internacionais de combate ao aquecimento global e de conservação
da biodiversidade. O momento histórico por que passa o Brasil inspira cuidados
na condução das políticas públicas. Escolhas
em 2018 podem implicar retrocessos. Um dos principais riscos que
enfrentamos tem a ver com a conversão de ecossistemas, sinônimo não apenas de
aumento do desmatamento como de perda de biodiversidade. O foco aqui extrapola
a Amazônia. O desmatamento acelerado no Cerrado, dentro dos limites autorizados
pelo Código Florestal, põe em risco a disponibilidade de recursos hídricos de
que a própria produção de alimentos depende.
Na agenda global do clima, o Brasil se
comprometeu a recuperar 15 milhões de hectares de pastagens degradadas, áreas
com aptidão para a agricultura, que podem garantir o aumento da área produtiva
sem aumentar o desmatamento. Mas, apesar de haver oferta de crédito, poucos são
os avanços nessa área. Como são tímidos os avanços também na meta de restaurar
12 milhões de florestas, compromisso associado à implementação do Código
Florestal, que segue a passos lentos. Apesar da sociedade ter se mobilizado
fortemente para barrar a extinção da Reserva Nacional do Cobre e Associados
(Renca), que liberaria uma imensa área na floresta amazônica à exploração
mineral, o garimpo ilegal avança em Unidades de Conservação, caracterizando um
novo vetor de desmatamento na Amazônia, apontou o Instituto Chico Mendes de
Conservação da Biodiversidade (ICMBio).
A opção está entre avançar sobre a vegetação
nativa remanescente ou valorizar a floresta em pé, por exemplo. Importante
lembrar que a extração florestal tem papel relevante na economia e que só a
extração de açaí, um destaque entre os produtos não madeireiros, rendeu R$ 540
milhões em 2016, segundo o IBGE. O valor obtido com o fruto arroxeado das
palmeiras é quase a metade dos royalties pagos por todas as mineradoras ao
conjunto dos municípios brasileiros em 2016, de acordo com o Departamento
Nacional de Produção Mineral. Desenvolver cadeias de produtos baseados na
biodiversidade capazes de alcançar mercados globais não está mais somente na
pauta do comércio exterior. Ganhou a agenda de um grupo de proeminentes
cientistas liderados pelo climatologista Carlos Nobre, do Instituto Nacional de
Pesquisas Espaciais (INPE).
O caminho, sugerem os estudiosos, é implantar
na floresta a Quarta Revolução Industrial, um movimento mundial em curso há
mais de uma década e que tende a revolucionar as sociedades com o uso de
genômica, nanotecnologias, inteligência artificial, robótica, internet das
coisas, blockchain. É um caminho novo que se abre. Nessa visão, o
olhar desloca-se de recursos como a água, o solo e os minérios para os recursos
biológicos. E, no caso do Brasil, agrega-se ainda outro fator fundamental: o
conhecimento ancestral dos povos e comunidades tradicionais sobre a
biodiversidade nativa, um acervo de que poucos países do mundo dispõem,
tornando-se junto com o extraordinário banco genético contido na
biodiversidade, uma vantagem competitiva.
A despeito das discussões sobre os potenciais
econômicos que a biodiversidade brasileira representa para cientistas
visionários, é preciso ter em mente que temas como mudanças climáticas ou a
conservação da biodiversidade não são preocupações apenas de ambientalistas. Têm
a ver com o dia a dia dos brasileiros. As mudanças climáticas, agravadas com o
desmatamento, estão na origem de fenômenos extremos como as secas que reduzem
os níveis de água dos reservatórios da hidrelétricas e aumentam as contas de
luz ou secam as torneiras de São Paulo e da capital do país. Segundo o
WWF-Brasil, as escolhas a serem feitas precisam envolver as cadeias produtivas,
empresas, consumidores e, por que não, os
eleitores; e apresentam algumas das
questões em jogo no pleito de 2018. A opção entre o avanço da destruição ou um
futuro promissor está posta.
A taxa média de desmate na Amazônia entre 2013
e 2017 foi 38% maior do que em 2012, quando se registrou a menor taxa. Desde
então, o corte vem crescendo, portanto, o desmatamento não está sob controle. E
podem atingir patamares anuais entre 9.391 e 13.789 quilômetros quadrados até
2027, mantida a mesma relação histórica entre rebanho bovino e área total
desmatada e considerando que a pecuária é um dos principais vetores de
desmatamento. Vizinho da Amazônia, o bioma Cerrado – tido como a savana mais
rica em biodiversidade do planeta – segue destino semelhante, se não mais trágico
que a floresta úmida. Nas últimas cinco décadas, praticamente a metade da
vegetação nativa do Cerrado foi abatida para abrigar principalmente soja e
gado. Longe de ter o mesmo nível de atenção dedicado pelo governo ao
desmatamento na Amazônia, o processo de conversão de vegetação nativa no
cerrado avança de modo acelerado, principalmente na região conhecida como
Matopiba – região com 73 milhões de hectares que engloba quase o Estado de
Tocantins e partes do Maranhão, Piauí e Bahia.
Juntos, Amazônia e Cerrado, perdem anualmente
cerca de 1,3 milhão de hectares de cobertura vegetal nativa, elevando as
emissões de gases de efeito estufa. Em 2016, elas subiram 8,9% em relação ao
ano anterior. Em números absolutos, o país emitiu em 2016 2,278 bilhões de
toneladas de gás carbônico equivalente (CO2 e), número que põe o Brasil em
sétimo lugar entre os maiores poluidores do planeta. Os municípios mais desmatados da Amazônia, por
exemplo, apresentam IDH inferior à média da região, mostrando que o
desmatamento não melhora os indicadores de desenvolvimento humano nesses
locais. Tampouco traz uma crescimento da economia que perdure além de um
ciclo rápido, acumulando problemas sociais e ambientais.
O Pantanal também está sendo dizimado. O
desmatamento acumulado no bioma é de 18%. O pior é que lá o corte se dá
justamente nas cabeceiras dos rios que anualmente inundam a planície e dão a
ela a característica peculiar que marca o Pantanal. A região das nascentes do
rio Paraguai, ao norte da bacia pantaneira – e que contribui com 30% da
água que desce para a planície –, é a área mais afetada pela conversão.
Pecuária, soja e cana são as maiores pressões. A Caatinga segue sem uma
política de controle ou monitoramento frequente. Em 2010, o Ministério do Meio
Ambiente divulgou o desmatamento do bioma, dominante na região Nordeste - dos
826.411 quilômetros quadrados, a Caatinga havia perdido 45,39% de sua cobertura
vegetal original.
Ø CAMINHOS PARA A
SOLUÇÃO
Mudar o modelo
vigente de ocupação do solo, zerar o desmatamento, recuperar parte do que
perdemos nas últimas décadas e, sobretudo, fomentar um novo modelo de uso e
conservação das florestas – talvez seja essa a principal ruptura que o Brasil
tenha a fazer neste momento. A implementação das metas definidas pelo país
junto ao Acordo de Paris e do Código Florestal por si só não serão suficientes
para reverter as emissões de gases de efeito estufa decorrentes do uso do solo,
nem tampouco eliminar o desmatamento. A NDC brasileira se propõe apenas a zerar
o desmatamento ilegal até 2030, e o Código Florestal garante por lei o direito
de desmatar em todos os biomas, dos Pampas à Amazônia. Sem incentivos
econômicos, não será possível manter de pé a floresta que resta em mãos de
proprietários privados. A saída é onerar quem desmata e estimular quem conserva
ou produz de maneira sustentável. Governos, iniciativa privada, cientistas e
ONGs devem buscar estabelecer um programa que dê respostas à necessidade de uso
das Reservas Legais em terras de particulares, encorajando o desmatamento zero
– imediatamente.
Para as regiões que
ainda têm vegetação nativa, a política pública deve fortalecer atividades
produtivas sustentáveis. Por exemplo, um robusto plano de utilização da
floresta para produção de madeira em larga escala capaz de desmontar os
esquemas ilegais com oferta de madeira proveniente de planos de manejo
autorizados e acompanhados pelo poder público. Para um novo modelo de uso do
solo prosperar, é fundamental definir formas de financiamento que possam
garantir iniciativas que já estão sendo amadurecidas, tanto no setor privado
quanto no âmbito do governo, como o Plano Nacional de Recuperação da Vegetação Nativa
(Planaveg), sob a responsabilidade do Ministério do Meio Ambiente, com a
participação de vários setores do governo.
Além disso, será
preciso integrar o Planaveg a outras políticas e ações de Estados, municípios,
organizações não governamentais e setor privado, de modo a estabelecer uma
política de recomposição da vegetação nativa em escala nacional. Mas é no
investimento maciço em pesquisa que está a esperança de que a floresta em pé
possa ser valorizada como um ativo econômico capaz de sustentar a transição
para uma economia de baixo carbono. A produção florestal brasileira alcançou R$
18,5 bilhões em 2016, dos quais R$ 540 milhões provêm da extração de açaí,
segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
Falando
especificamente do setor madeireiro, temos um imenso potencial de
desenvolvimento econômico e social na Amazônia, baseado nas vocações de uso das
florestas naturais da região com base na legalidade, transparência e rastreabilidade
de sua produção. De acordo com dados do Serviço Florestal, esse setor produz
aproximadamente 13 milhões de m3 por ano, gerando uma renda bruta de
R$ 4,3 bilhões e mais de 200 mil empregos diretos, o equivalente a 2% da
população economicamente ativa da região. Vale lembrar que, em 2012, as
exportações de madeira da Amazônia Legal somaram cerca de US$ 500 milhões.
O potencial
biotecnológico a partir da biodiversidade da Amazônia sequer começou a ser
explorado. Poderia, na opinião de cientistas como o climatólogo Carlos Nobre,
promover uma nova Revolução Industrial. Mas, para isso, precisamos que a
floresta esteja disponível para a investigação científica.
Ø PONTOS DE ATENÇÃO
·
Ampliar o
monitoramento do desmatamento para todos os biomas até 2019;
- Aumentar a eficácia na punição aos crimes
ambientais;
- Perseguir a meta do desmatamento zero;
- Onerar o desmatamento e os produtos de
sistemas de produção oriundos do desmatamento dos biomas brasileiros;
- Estimular a economia florestal por meio de
políticas de governo (Concessão Florestal, Política Nacional da
Sociobiodiversidade);
- Destinar maciços investimentos à ciência e à
biotecnologia;
- Estabelecer mecanismos de incentivos
positivos para aqueles que conservam florestas além da exigência legal;
- Ampliar o monitoramento completo das cadeias
produtivas, os sistemas e mecanismos de rastreabilidade e o bloqueio de
produtores que desmatam;
- Pactuar o Plano Nacional de Recuperação da
Vegetação Nativa (Planaveg);
- Implementar a política de utilização de
terras degradadas para o agronegócio;
- Destinar terras públicas preferencialmente
para a conservação e uso sustentável da biodiversidade;
- Ampliar a moratória da soja para o Cerrado.
Fonte:
g1.globo.com – As eleições e o aumento do
desmatamento.
WWF-Brasil – Eleições 2018 e as diretrizes para
a redução do desmatamento.
* Engenheiro Agrônomo, Mestre em Recuperação de
Áreas Degradadas e Gestão Ambiental e Doutor em Engenharia de Água e Solo pela Universidade
Federal de Viçosa. Foi professor do IF Sudeste de Minas campus Rio Pomba.
Atualmente, IFES campus de Alegre. E-mail: mauriciosnovaes@yahoo.com.br.
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