* Maurício Novaes Souza
A ação do homem sobre o meio ambiente é tão remota quanto
a sua própria história: de fato, o homem é, por natureza, um animal devastador!
Essa conclusão é pertinente quando se consideram que a humanidade enfrenta
problemas de degradação ambiental que remontam no tempo. A natureza, graças à
sua resistência e resiliência, à baixa população humana, aos seus hábitos
itinerantes, reabilitava-se naturalmente. Entretanto, o meio ambiente, que
sempre desempenhou a função depuradora com eficiência, encontra-se hoje
excessivamente sobrecarregado pelas atividades antrópicas: sofre o risco de
exaustão dos seus recursos, não conseguindo em determinadas situações, recuperar-se
por si só, necessitando o auxílio do homem.
Contudo, nas últimas décadas, os
efeitos ambientais degradatórios se intensificaram de forma insustentável para
a capacidade de suporte da terra, considerada para o atual momento, tendo como
base as tecnologias disponíveis nos dias atuais. Tais processos de degradação se
devem, parcialmente, ao elevado grau de aceleração da tecnologia transformadora
desenvolvida pelo homem, além da forma como vem sendo empregada, ao interferir
direta e indiretamente sobre os recursos naturais, renováveis ou não
renováveis, com destaque para os combustíveis fósseis.
Soma-se
a essa realidade, o crescimento demográfico concentrado especialmente nos
centros urbanos, que atua radicalmente sobre os recursos naturais, limitados
frente ao modelo de desenvolvimento que requer uma demanda ilimitada para a
produção de alimentos, energia e bens de consumo. O crescimento desordenado do
binômio população/consumo propicia a produção de resíduos tóxicos e elementos
residuais não degradáveis ou degradáveis ao longo de centenas de anos. O
passivo ambiental ou o depauperamento dos recursos ambientais geram danos
irreparáveis: seja no esgotamento e perdas dos solos, da água, diversidade de
plantas e animais, ou mesmo na descaracterização da paisagem e dos elementos que
a compõem.
Assim,
verifica-se, atualmente, que apenas quando o nível de degradação ambiental
atingiu níveis alarmantes, o Homo sapiens
começa a tomar consciência da necessidade da preservação das condições
ambientais do nosso planeta. Tal processo se deve ao fato dos processos de
degradação ser acumulativos: destaque às últimas décadas, requerendo da
sociedade, cuidados e atenção com o meio ambiente, que possibilitaram a criação
de instrumentos e mecanismos de proteção por meio da prevenção, recuperação ou
reabilitação do meio ambiente, bem como dos ecossistemas ameaçados ou
degradados pela ação antrópica.
O desflorestamento,
as mudanças de uso do solo, o aquecimento global, as mudanças climáticas, o uso
abusivo de agroquímicos, a produção crescente de efluentes agroindustriais e
urbanos, a ausência de saneamento básico, a escassez de água potável e os
custos com o tratamento daquelas cada vez mais poluídas, são preocupações
recentes. Agravam-se quando somados às desigualdades sociais, em
particular nos países ou regiões subdesenvolvidas, onde desencadeiam situações
extremas de descuido ou falta de informações, dentre outras causas, devido aos
altos índices de analfabetismo, que sobrepõem e dificultam medidas de controle,
execuções de programas e recuperação dos recursos ambientais: nos países mais
ricos e educados, programas de recuperação obtêm adesão e sucesso de forma mais
acelerada.
Quando o foco objetiva proteção, a
noção de meio ambiente é muito ampla, abrangendo todos os bens naturais e
culturais de valor para a sociedade. Alguns destes são detentores de mecanismos
técnicos e legais que os protegem, tais como o solo, a água, o ar, a flora e a
fauna, os elementos de belezas naturais e artificiais, como o patrimônio
histórico, artístico e paisagístico, elementos arqueológicos e espeleológicos,
sendo o homem, entretanto, o elemento central. A legislação brasileira é rica e
bem construída: apesar de sua aplicabilidade se dar por meio de um processo
lento, por questões diversas (culturais e políticas), vinha se tornando
evidente o crescimento às causas ambientais - pelos órgãos governamentais e
pelos empresários, urbanos e rurais, com a cobrança e o apoio da sociedade.
Assim,
a situação no Brasil caminhava para a busca do estabelecimento de novos marcos:
uma boa legislação e a efetividade. No entanto, neste segundo ano da
administração de Jair Bolsonaro, observou-se na área ambiental o aprofundamento
de medidas adotadas a partir de 2019 para eliminar regulamentações, por um
lado; e, por outro, abdicar da gestão ambiental. Ao mesmo tempo em que desmonta
a governança ambiental construída desde a Constituição de 1988, o governo se
recusa a fazer política pública, como ficou evidenciado nesse início de 2021,
pelos números da execução orçamentária do Ministério do Meio Ambiente.
No
Brasil, por exemplo, a agropecuária é causadora de uma série de impactos
ambientais, não sendo apenas por uma questão de tecnologia: mas sim do modelo
de agronegócio colocado como o prioritário no Brasil, que o atual governo
estimula. Para sustentar essa lógica, empresas e produtores usam sem controle
os agroquímicos, o que afeta de forma muito negativa a imagem da economia
brasileira no exterior. O problema não é só a química, mas a maneira como ela é
usada. O que se vê no Brasil é o domínio do agronegócio pelas grandes
multinacionais. É preciso haver regulação do agronegócio e fortalecimento da
agricultura familiar que acaba inviabilizada não apenas pelo agrotóxico, mas
pelo conjunto do modelo do agronegócio.
Estudo
divulgado em 03/2012 pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA)
apontou que o comércio de agrotóxicos no Brasil cresceu 190% entre 2000 e 2010:
o dobro da média mundial - de 93%. O mercado nacional de agrotóxicos, que em
2010 movimentou US$ 7,3 bilhões, é altamente concentrado, assim como no
restante do mundo. As dez maiores empresas do setor são responsáveis por 65% da
produção nacional e por 75% das vendas. O levantamento também mostrou que um
único produto, o GLIFOSATO, é responsável por 29% do mercado brasileiro de
agrotóxicos. (Fonte: Thais Leitão/
Agência Brasil). Em 2020,
de acordo com a ANVISA, foram liberados 493 agrotóxicos, 4% a mais do que em 2019, o recorde até então registrado, todos
aprovados com enorme rapidez.
Segundo
a Amazon.org, o Brasil não é apenas o campeão mundial em consumo de agrotóxicos
(mais de US$ 10 bilhões ao ano), mas também o maior comprador de agrotóxicos altamente
perigosos (HHPs) - designação das Nações Unidas para agrotóxicos que contêm
ingredientes ativos com toxicidade extremamente aguda, que persistem no meio
ambiente e em organismos, e com efeitos negativos crônicos na saúde humana e no
meio ambiente, mesmo sob níveis de exposição muito baixos. Essa é a conclusão
de uma investigação realizada pela Unearthed, organização jornalística
independente financiada pelo Greenpeace UK, em parceria com a ONG suíça Public
Eye.
A
equipe do estudo cruzou dados referentes à US$ 23,3 bilhões em vendas de agrotóxicos
para 43 países em 2018 (cerca de 40% do mercado global) com a lista de HHPs da
Pesticide Action Network (PAN). O conjunto aprofundado de dados foi dividido
por ingrediente ativo para determinar o valor e a porcentagem de cada venda
referente aos agrotóxicos altamente perigosos. A análise mostrou que 42,4% das
vendas totais (US$ 9,9 bilhões) foram de HHPs. Desse grupo de agrotóxicos
altamente perigosos, o Brasil respondeu por mais de um quinto (22,2%), com US$
2,2 bilhões.
Além
disso, os cinco principais fabricantes de agrotóxicos do mundo - Syngenta
(Suíça); Bayer e BASF (ambos sediados na Alemanha); e Corteva e FMC (ambos nos
Estados Unidos) - responderam por 80% de todas as vendas de agrotóxicos ao
Brasil; 72% desse total foi de HHPs (US$ 1,6 bilhão). Essas empresas, junto com
a Sumitomo Chemical, combinam sua influência política por meio da CropLife
International, associação da indústria de agrotóxicos e grupo lobista com sede
em Bruxelas. (Fonte: amazonia.org.br)
Os
maiores consumidores de agrotóxicos no Brasil, cerca de 80%, são as grandes
áreas de elevada tecnologia, ligadas à soja, à cana-de-açúcar, ao trigo, ao
algodão, entre outros. Esse grande mercado preocupa em menor escala, porque em
geral conta com engenheiros agrônomos e empresas devidamente instaladas. O que
nos traz mais preocupação são as áreas de agriculturas menores, de cinturões
verdes, que representam 15% do mercado, mas 90% do problema em função
principalmente dos desvios de uso, de acordo com o diretor geral de agrotóxicos
do Ministério da Agricultura.
Segundo
definição do ministério, os agrotóxicos são produtos e agentes de processos
físicos, químicos ou biológicos, destinados ao uso nos setores de produção,
armazenamento e beneficiamento, pastagens, proteção de florestas nativas ou
implantadas e de outros ecossistemas, bem como de ambientes urbanos, hídricos e
industriais. Para ser comercializado no país, o agrotóxico precisa ser
registrado pelo Ministério da Agricultura, pelo Instituto Brasileiro do Meio
Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) e pela Agência Nacional de
Anvisa. (Fonte: Thais Leitão/
Agência Brasil)
Entretanto,
nos dias atuais, sociedades até então interessadas apenas no seu Produto
Interno Bruto passaram a questionar a validade do crescimento econômico sem a
correspondente equivalência em bem-estar da população. Questionaram as
atividades poluentes e as consumidoras de recursos naturais, vistos até então
como meros produtos ambientais de propriedade comum, portanto, de livre acesso
e considerados inesgotáveis. Recentemente, essa preocupação ganhou adeptos em
todo o mundo e, efetivamente, existe uma maior conscientização relativa às
causas ambientais. As externalidades geradas pelo progresso a qualquer custo
passaram a ser avaliadas e existe a intenção de mitigá-las/internalizá-las.
Assim,
as empresas urbanas e rurais, dentro dessa nova visão, devem realizar o
planejamento ambiental para estabelecer os seus principais aspectos e
diretrizes; ou seja, todos os fatores que direta ou indiretamente afetam ou
possam afetar o meio ambiente, tais como a produção de resíduos sólidos, de
efluentes líquidos, gasosos, consumo de energia e de água, que devem ser
abordados na implantação e, ou, na operação das empresas. A cafeicultura no
Espírito Santo, principal atividade agropecuária, com as pesquisas do Ifes, da
Incaper, da Ufes e da EMBRAPA, vem delineando um novo modelo de condução de
suas lavouras. Empresas ligadas a esses estabelecimentos de pesquisa, com a
Caparáo Júnior do Ifes campus de Alegre, vêm promovendo uma verdadeira
revolução modernizadora, em busca da sustentabilidade socioeconômica e
ambiental.
Cabe
considerar que os aspectos ambientais se referem a um ou mais elementos das
atividades, produtos ou serviços, que podem influir no meio ambiente,
provocando impactos ambientais. Portanto, para iniciar o processo de
implantação de um empreendimento é importante avaliar, além dos componentes do
processo produtivo ou atividades prestadoras de serviços, os aspectos
ambientais relacionados à mesma, tais como: a) características ambientais do
local de implantação do projeto; b) recursos naturais utilizados; c) forma de
utilização destes recursos; d) etapas do processo de produção ou das atividades
geradoras de resíduos; e) tipos de resíduos gerados e a sua devida destinação;
f) consumo de água; e g) consumo de energia.
Assim
sendo, propõem-se passos para a inserção da variável ambiental na fase de
implantação das empresas, sendo a primeira a Localização do empreendimento e a sua área de influência - devem-se
analisar previamente as condições ambientais do local de instalação
do empreendimento, avaliando: a ocupação da área, a qualidade do ar, dados
meteorológicos da área (índices pluviométricos, direção e velocidades dos
ventos), o balanço hídrico (necessário para alguns projetos, especialmente os
agrícolas), a bacia hidrográfica em que está localizado e a qualidade ambiental
da mesma, o zoneamento urbano e rural (caso de Unidades de Conservação), entre
outros; caso se aplique ao tipo de empreendimento proposto. Deve-se neste
quesito destacar, especialmente a situação da vizinhança, potencialmente
afetada pelo empreendimento.
Além
disso, é fundamental descrever a infraestrutura existente no local,
especialmente a existência de saneamento (rede de esgoto e abastecimento de
água) e energia. A análise ambiental da localização deve orientar o
licenciamento ambiental prévio do empreendimento, sendo importante quesito para
aprovar a viabilidade do projeto da empresa.
É
importante mencionar, que deverá ser observada com extrema cautela a existência
ou não de áreas naturais protegidas e de mananciais, tal como Áreas de Proteção
Permanente (APP), que geralmente inviabilizam a execução de empreendimentos de
risco ambiental. Ainda, cabem ressaltar a necessidade de se conhecer o
histórico de uso das áreas escolhidas, observando, especialmente, a existência
de passivos ambientais de outras atividades anteriormente usuárias da área,
pois caso contrário estar-se-á assumindo ônus ambientais de terceiros.
Essas
questões, tão amplas, exigem que se tenham uma visão holística da paisagem e
conhecimentos técnicos profundos. É sabido que quanto mais são pesquisadas as
questões ambientais, maior a consciência que se passa a ter de que elas não
podem ser compreendidas isoladamente, posto serem sistêmicas, interconectadas e
interdependentes. Grande parte dos problemas hoje existentes está associada ao
descaso e desconhecimento humano de entender e controlar sistemas cada vez mais
complexos.
No
pensamento sistêmico, o princípio da interdependência demanda que mudanças em
qualquer um dos componentes de determinado sistema, direta ou indiretamente,
estão associadas ou afetarão os demais componentes. Por este motivo, as
informações existentes dentro desse sistema, provocam a sua retroalimentação
interna e nas suas relações com o meio no qual está inserida, podendo alcançar
as mudanças desejáveis propostas, ou mostrar o direcionamento necessário para
que lacunas diagnosticadas dentro do atual modelo sejam alteradas, atingindo,
assim, os resultados esperados.
Devem
ser considerados, também, os contextos político e socioeconômico, bem como as
suas principais inter-relações, no qual o setor em estudo está inserido. Dessa
forma, na maior parte do tempo, tais esquemas intervêm na parte introdutória
dos relatórios de pesquisa e corresponde à fase de diagnóstico da situação do
objeto de pesquisa, aquela onde se torna precisa a definição concentrada das
principais questões a serem estudadas.