domingo, 28 de junho de 2009

Desenvolvimento sustentável: a importância da consciência e da gestão ambiental



* Por Maurício Novaes Souza

Durante o período das chamadas “Revolução Industrial” e “Revolução Verde” não havia preocupação com as questões ambientais. Os recursos naturais eram abundantes e a poluição não era foco da atenção da sociedade industrial e intelectual da época. A partir da escassez dos recursos naturais, somado ao crescimento desordenado da população mundial e intensidade dos impactos ambientais, surge o conflito da sustentabilidade dos sistemas econômico e natural, fazendo do meio ambiente um tema literalmente estratégico e urgente. O homem começa a entender a impossibilidade de transformar as regras da natureza e a importância da reformulação de suas práticas ambientais.

A humanidade está usando 20% a mais de recursos naturais do que o planeta é capaz de repor. Ou seja, ou limites do crescimento não foram observados, ultrapassaram-se a capacidade de suporte, de autodepuração e de regeneração dos sistemas. Assim, estão-se avançando sobre os estoques naturais da Terra, comprometendo as gerações atuais e futuras, segundo o Relatório Planeta Vivo 2002 elaborado pelo WWF. De acordo com o relatório, o planeta tem 11,4 bilhões de hectares (ha) de terra e espaço marinho produtivos - ou 1,9 ha de área produtiva per capita. Contudo, a humanidade está usando o equivalente a 13,7 bilhões de ha para produzir os grãos, peixes e crustáceos, carne e derivados, água e energia que consome. Cada um dos 6 bilhões de habitantes da Terra, portanto, usa uma área de 2,3 ha. Essa área é a Pegada Ecológica de cada um. O fator de maior peso na composição da Pegada Ecológica hoje é a energia, sobretudo nos países mais desenvolvidos.

A Pegada Ecológica de 2,3 ha é uma média. Mas há grandes diferenças entre as nações mais e menos desenvolvidas, como mostra o Relatório Planeta Vivo, que calculou a Pegada de 146 países com população acima de um milhão de habitantes. Os dados de 1999 mostram que enquanto a Pegada média do consumidor da África e da Ásia não chega 1,4 hectares por pessoa, a do consumidor da Europa Ocidental é de cerca de 5,0 ha e a dos norte-americanos de 9,6 ha. Embora a Pegada brasileira seja de 2,3 ha – dentro da média mundial, está cerca de 20% acima da capacidade biológica produtiva do planeta.

Quanto se fala em emissões de poluentes, as diferenças dos índices emitidos pelos países desenvolvidos e em desenvolvimento também são significativas: um cidadão médio norte-americano, por exemplo, responde pela emissão anual de 20 toneladas anuais de dióxido de carbono; um britânico, por 9,2 toneladas; um chinês, por 2,5; um brasileiro, por 1,8; já um ganês ou um nicaragüense, só por 0,2; e um tanzaniano, por 0,1 tonelada anual (Wolfgang Sachs, do Wuppertal Institute).

Nos países industrializados cresce cada vez mais o consumo de recursos naturais provindos dos países em desenvolvimento - a ponto daqueles países já responderem por mais de 80% do consumo total no mundo. Segundo Sachs, 30% dos recursos naturais consumidos na Alemanha vêm de outros países; no Japão, 50%; nos países Baixos, 70%. Dessa forma, o grande desafio da humanidade é promover o desenvolvimento sustentável de forma rápida e eficiente. Este é o paradoxo: sabemos que o tempo está se esgotando, mas não agimos para mudar completamente essa situação antes que seja demasiado tarde.

Viu-se no filme “Uma verdade Inconveniente” que uma rã posta na água fervente saltará rapidamente para fora, mas se a água for aquecida gradualmente, ela não se dará conta do aumento da temperatura e tranqüilamente se deixará ferver até morrer. Situação semelhante pode estar ocorrendo conosco em relação à gradual destruição do ambiente natural. Hoje, grande parte da sociedade se posiciona como mero espectador dos fatos, esquecendo-se de que somos todos responsáveis pelo futuro que estamos modelando. Devemos exercer a cidadania planetária, e rapidamente.

A conscientização ambiental de massa só será possível com percepção e entendimento do real valor do meio ambiente natural em nossas vidas. O meio ambiente natural é o fundamento invisível das diferenças socioeconômicas entre países desenvolvidos e em desenvolvimento. O dia em que cada brasileiro entender como esta questão afeta sua vida de forma direta e irreversível, o meio ambiente não precisará mais de defensores. A sociedade já terá entendido que preservar/conservar o meio ambiente é garantir a própria vida. Fragilizar o meio ambiente é fragilizar a economia, o emprego, a saúde, e tudo mais. Esta falta de entendimento compromete a adequada utilização de nossa maior vantagem competitiva frente ao mundo: recursos hídricos, matriz energética limpa e renovável, biodiversidade, a maior floresta do mundo, e tantas outras vantagens ambientais que nós brasileiros temos e que atrai o olhar do mundo.

Mas, se nada for feito de forma rápida e efetiva, as próximas gerações serão prejudicadas duplamente, pelos impactos ambientais e pela falta de visão de nossa geração em não explorar adequadamente a vantagem competitiva de nossos recursos naturais. As sugestões encontradas nos modelos de gestão ambiental, além de despertarem a consciência ambiental que se faz indispensável nesse momento de crise, podem garantir um modelo de desenvolvimento que seja sustentável.

* Engenheiro Agrônomo, Mestre em Recuperação de Áreas Degradadas e Gestão Ambiental e Doutor em Engenharia de Água e Solo. É professor do IFET/Rio Pomba, coordenador dos cursos Técnico em Meio Ambiente, EAD em Gestão Ambiental e Pós-graduação em Agroecologia e Desenvolvimento Sustentável. É Conselheiro do COPAM e consultor do IBAMA. E-mail: mauriciosnovaes@yahoo.com.br.

Economia, Sociedade e Ambiente: realidade na sustentabilidade do desenvolvimento


* Por Maurício Novaes Souza

A triste, cruel e inquietante realidade ambiental vêm sendo ainda ignorada ou menosprezada pela maioria dos governos, das comunidades e de cada uma das pessoas. Torna-se cada vez mais evidente que a humanidade se defronta com um sério dilema nos tempos atuais. É preciso reiterar as análises críticas e perspectivas sobre a questão sócio-ambiental e sua inseparável relação com a dinâmica econômica dos países no mundo. O Brasil é um celeiro de biodiversidade; contudo, os sistemas produtivos apresentam medíocre e dicotômica relação economia-ambiente.

Não há dúvidas de que mecanismos para superação de quadros críticos relacionados à produção e ao uso dos recursos naturais vêm sendo desenvolvidos, implantados e aplicados, porém com uma velocidade e eficácia distante daquela necessária. Nesse sentido, não oponente às várias reuniões mundiais em que o tema meio ambiente era pauta, nos últimos anos a preocupação em alinhar necessidades de consumo e, ou, de produção com o uso dos recursos naturais, esteve e está presente.

Foi vinculado um laço de comprometimento conduzido por todos os “stakeholders” (partes envolvidas e interessados, tais como ONG’s, Corporações, Governos e Organismos Internacionais), de todo o mundo, provocando uma comoção internacional direcionada à relação economia-ambiente, que gerou reformulações quanto ao aspecto jurídico, político-social, econômico e, sobretudo, de mercado. É nesse viés que o surgimento de um novo paradigma sócio-ambiental é erguido para a condução do desenvolvimento sustentável.

Dessa forma, por ser uma ciência social aplicada, a Economia não se pode furtar da possibilidade de gerar limites e possibilidade para o planejamento de uma sociedade que vem usando ilimitadamente os recursos ambientais. Continuar agindo assim, seria uma sabotagem à sobrevivência humana. A partir de uma análise global na relação Economia–Ambiente, o debate está colocado. Faz-se fundamental a construção de uma sociedade composta por tecnologias limpas, processos produtivos sustentáveis, manutenção e preservação dos recursos naturais. Reivindicam-se uma reestruturação da sociedade moderna e, ou, pós-moderna, com características diferenciadas do que se vive na atualidade, bem como do setor produtivo, dos agentes econômicos e do governo, junto à concepção de gestão ambiental e responsabilidade sócio-ambiental.

Nesse sentido, há de se considerar a importância de se conhecerem os princípios básicos que regem o meio ambiente e como as atividades humanas podem interferir. Isto pode ser observado como um dos resultados do processo de globalização, onde a relação de mercado não considera a dinâmica ambiental ou as transformações ambientais decorrentes do uso dos recursos naturais como um elemento de análise estrutural e conjuntural. Este cenário é devidamente aplicado ao contexto mundial e, sobretudo, brasileiro, quando emerge essa nova intenção mercadológica em face às questões que envolvem crescimento e desenvolvimento econômicos, a questão ambiental e o princípio de desenvolvimento sustentável.

De acordo com Rafael Vieira - economista, consultor em Meio Ambiente (Enviromental Consultant in Offshore) e professor da UniverCidade e da UNIGRANRIO - no Brasil, a absorção de um “novo paradigma sócio-ambiental” é reiterada pelo segmento empresarial que sabe que os mecanismos para ingressar e permanecer no mercado são essenciais. A esse respeito também é importante ressaltar que as oportunidades que revelam a fundamental mudança de atitude, no caso brasileiro, como as de implantação de modelos de gestão ambiental e de implementação das normas referentes à segurança no trabalho, com respeito às questões sociais, estão diretamente ligadas ao meio ambiente e geram oportunidades nas dimensões do espaço econômico.

Assim, segundo esse mesmo autor, não furtando a existência de uma concepção com tendência implícita essencialmente na lógica de mercado, o setor privado propôs assumir o princípio do desenvolvimento sustentável, considerando a premissa que a sua base é um sistema de mercados abertos e competitivos em que os preços refletem com as transparências dos custos, inclusive os ambientais: a competição estimula os produtores a usar o mínimo de recursos, reduzindo o avanço sobre os sistemas naturais. Também os estimula a minimizar a poluição, se são obrigados a pagar pelo seu controle e pelos danos causados ao meio ambiente. Deverão promover a criação de novas tecnologias para tornar a produção mais eficiente do ponto de vista econômico e ambiental. Faz-se também, fundamental, a internalização das externalidades positivas.

Enfim, não há, portanto, qualquer desconfiança de que o mercado brasileiro e o mundial foram direta ou indiretamente pressionados para apresentar uma nova identidade e coexistir na sua lógica com o uso dos recursos naturais, remetendo-se a outros conceitos inerentes à dinâmica de mercado atual, que são a responsabilidade social e a responsabilidade ambiental. A postura do setor privado em destacar o planejamento ambiental junto ao seu projeto de desenvolvimento é, atualmente, uma das vertentes de adequação e adoção de um novo paradigma sócio-ambiental - deverá incluir os aspectos ecológico-econômico, jurídico-ambiental, social e político para a geração da sustentabilidade e do desenvolvimento.


* Engenheiro Agrônomo, Mestre em Recuperação de Áreas Degradadas e Gestão Ambiental e Doutor em Engenharia de Água e Solo. É professor do IFET/Rio Pomba, coordenador dos cursos Técnico em Meio Ambiente, EAD em Gestão Ambiental e Pós-graduação em Agroecologia e Desenvolvimento Sustentável. É Conselheiro do COPAM e consultor do IBAMA. E-mail: mauriciosnovaes@yahoo.com.br.

quarta-feira, 24 de junho de 2009

PAISAGISMO URBANO E RECUPERAÇÃO DE ÁREAS DEGRADADAS


* Por Maurício Novaes Souza1; Jhennifer Alves Pereira Mata2 e Mauro César Martins3

O ser humano foi capaz de conviver “harmoniosamente” com o planeta Terra por muitos anos. No entanto, embora haja uma grande fronteira “dominada” pelo homem, podem-se observar a aglomeração da população mundial em centros urbanos. Ao contrário dos ambientes naturais, as cidades apresentam artificialidades, tais como: forte impermeabilização do solo; abundância de materiais altamente refletores, absorventes e transmissores de energia; excessivo consumo de energia e matéria, com correspondente geração de resíduos; poluição atmosférica, hídrica, sonora e visual.

Tais características afetam negativamente o ambiente urbano - em consequência, a qualidade de vida das pessoas. Este fato é agravado pela desenfreada devastação da vegetação ao redor dos centros urbanos e pela deficiência na implantação de áreas verdes no seu interior. A presença de árvores, além de diminuir a poluição, traz benefícios em relação à saúde e ao bem-estar da população, podendo ocasionar zonas de conforto térmico. Altas temperaturas afetam significativamente a temperatura no corpo humano e a freqüência respiratória, podendo causar estresse e redução no rendimento das atividades humanas. Em vegetais e animais, o desconforto térmico ocasiona redução ao seu desenvolvimento, o torna suscetível a pragas e doenças, gerando prejuízos econômicos. Daí a importância da presença de árvores nos meios urbanos.

Contudo, o paisagismo não é apenas a criação de jardins por intermédio do plantio desordenado de algumas plantas ornamentais. É uma técnica artesanal aliada à sensibilidade, que procura reconstituir a paisagem natural dentro do cenário devastado pelas construções. Requer conhecimentos de botânica, ecologia, variações climáticas regionais e estilos arquitetônicos, sendo também importante o conhecimento das compatibilidades plásticas para o equilíbrio das formas e cores.

A finalidade do paisagismo é a integração do homem com a natureza, facultando-lhe melhores condições de vida pelo equilíbrio do meio ambiente. Ele abrange todas as áreas onde se registra a presença do ser humano. Até mesmo nos desertos se é notada a presença dos seres humanos nos oásis, onde existe vegetação nativa ligada à água. Desde as áreas rurais até as regiões metropolitanas, o paisagismo deve atuar como fator de equilíbrio entre o homem e o ambiente.

A manutenção de áreas verdes nas grandes indústrias influencia positivamente para o aumento da produção, chegando a assegurar uma diminuição nos índices de acidentes de trabalho. Uma paisagem mais amena nas áreas das fábricas, suavizando a artificialidade metálica dos maquinários de trabalho, diminui a tensão dos trabalhadores. O paisagismo urbano tem por objeto os espaços abertos (não construídos) e as áreas livres, com funções de recreação, amenização e circulação, entre outras, sendo diferenciada entre si pelas dimensões físicas, abrangência espacial, funcionalidade, tipologia ou quantidade de cobertura vegetal.

A criação de jardins internos, nas residências ou em áreas comerciais, comprova a necessidade do ser humano em manter-se ligado à natureza. Embora haja uma política crescente com relação à criação de parques, praças e avenidas arborizadas, ainda faltam estudos sobre quais espécies são mais indicadas para compor estas áreas/faixas verdes. Algumas espécies apresentam melhores condições morfológicas para serem plantadas em centros urbanos, visando seu efeito na temperatura e umidade relativa do ar.

Para cada projeto de paisagismo, existem fatores a se considerar, tais como: o porquê de implantar, onde implantar, como implantar, como manter, que estilo, que cores e quais as características desejáveis das plantas. Para a arborização de ruas, normalmente cada cidade tem suas regras e modelos estabelecidos por profissionais da área, que irão avaliar ruas, avenidas, praças, parques, jardins públicos e, após, implantar seu projeto de forma mais adequada às condições da cidade. Quanto a jardins de prédios, de casas, de indústrias ou escritórios, escolas e clubes particulares, há uma série de outros fatores relevantes, e normalmente há mais maleabilidade na realização do projeto.

Com relação aos ecossistemas aquáticos e os conflitos com a obrigatoriedade de preservação da qualidade hídrica dos mananciais, a ocupação urbana promove o crescente desmatamento e a impermeabilização do solo. O resultado disso se traduz no assoreamento de rios e córregos com a freqüência ainda maior de cheias e inundações, que atingem exatamente os estratos mais pobres da população. As funções ecológicas das áreas verdes urbanas auxiliam na prevenção, minimização ou reversão dos processos de degradação, promovendo a recuperação e conservação ambiental.


* 1. Engenheiro Agrônomo, Mestre em Recuperação de Áreas Degradadas e Gestão Ambiental e Doutor em Engenharia de Água e Solo. É professor do IFET/Rio Pomba, coordenador dos cursos Técnico em Meio Ambiente, EAD em Gestão Ambiental e Pós-graduação em Agroecologia e Desenvolvimento Sustentável. É Conselheiro do COPAM e consultor do IBAMA. E-mail: mauriciosnovaes@yahoo.com.br.

2. Tecnóloga e Bacharelanda em Agroecologia do IFET/RIO POMBA. E-mail: jhenniferalpem@yahoo.com.br.
3. Zootecnista, Especialista em Gestão Ambiental e Técnico de Laboratório do IFET/RIO POMBA. E-mail: mcmsagrado@yahoo.com.br

“Agricultura Familiar: sustentabilidade no agronegócio"


*Maurício Novaes Souza ¹; Maria de Fátima Vieira Aguiar ²

No mundo do agronegócio, onde se utilizam e se produzem várias commodities, é preciso atenção para as relações custos-benefícios dos diversos fatores de produção de um determinado empreendimento. O Brasil é por excelência um grande mercado agroexportador, com enorme potencial para futuros investimentos, pois as condições naturais lhes são favoráveis. Contudo, considerando o momento atual, com as alterações climáticas, a degradação do solo, a poluição hídrica, o acelerado crescimento demográfico e a urbanização, faz-se necessário um planejamento estratégico onde se inclua a agricultura familiar, de fato, no agronegócio brasileiro.

O Brasil exporta para China em torno de 18 milhões de toneladas de soja por ano (saltaram de US$ 1,3 bilhão em 2003 para US$ 5,3 bilhões em 2008) – o grande problema é que em seu processo produtivo se utilizam 43 km3 de água. A Europa importa 50 milhões de toneladas de elementos de ração animal: 39 milhões de toneladas de soja, dos quais 20 milhões são provenientes do Brasil. Em 2003 exportou 1,3 milhões de toneladas de carne – são mais 19,5 km3 de água exportada e não contabilizada.

Segundo o professor Christofidis, doutor em Gestão Ambiental pela Universidade Federal de Brasília, este é um passivo ambiental pesado para o país. Até 2059 a população mundial deverá atingir nove bilhões de pessoas. Segundo a UNICAMP, para se produzir soja e arroz, a demanda por água é bastante elevada. Considerando o agravamento da crise econômica e ecológica dos dias atuais, devem-se avaliar novas alternativas para a produção e destino dos alimentos.

Segundo a folha online de 15/05/09, os produtos alimentícios básicos mais exportados no país são a carne de frango, café em grão, carne bovina, soja e milho. Conforme o economista Chau Kuo Hue, este aumento se deve aos preços internacionais favoráveis e à capacidade do Brasil produzir. Para a economista Leila Harfuch, este fato é positivo: “Mas é claro que se houvesse um esforço maior para exportar produtos de maior valor agregado seria melhor”. Fernando Ribeiro, economista-chefe da Funcex, afirma que exportar produtos básicos prejudica o país, pois a economia fica dependente de poucos produtos, o que leva a perda de divisas.

Entretanto, Paulo Skaf representante da Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo), visando a indústria, diz que a valorização do real é o maior empecilho às exportações de bens industrializados e que se não fosse o câmbio estaríamos comercializando mais em todo mundo, gerando divisas, e mais empregos aqui no Brasil. O segundo setor pode até gerar divisas, aumentar a empregabilidade, mas o setor agrícola continua sendo a grande preocupação de muitos especialista que colocam o aspecto sócio-ambiental na meta de crescimento com sustentabilidade.

Em “Navios que se Cruzam na calada da noite. Soja sobre o oceano”, Luc Vankrunkelsven relata a sua grande preocupação com a fome no mundo. Sugere que o futuro do sistema produtivo reside no Brasil e na Agricultura Familiar. Mas porque o Brasil? Pela abundância de terras, seus recursos hídricos, a localização geográfica, tudo isso a uma política de exportação para geração de divisas. Cita, como forte preocupação, a monocultura que se inicia a partir da “Revolução Verde” – com destaque para a soja.

Empresas como a Cargill e a Bunge controlam a produção e o comércio de grãos no Brasil. Os herbicidas da Monsanto, apesar da rígida legislação e multas, são persistentes o seu uso e a contaminação do solo e dos ecossistemas aquáticos. Estes fatos, aliados aos baixos preços e a mão-de-obra barata em regiões produtoras do centro-oeste e sul do país, que o Brasil tem conseguido a auto-suficiência em alimentos voltados à exportação e à geração de energia. Como consequência, a degradação ambiental, a desapropriação da agricultura familiar e o êxodo rural, com o recrudescimento das lutas em prol da reforma agrária.

Segundo Vankrunkelsven (2006), o Brasil possui um capital natural e espaço físico favorável para produção de energia. Comenta que desde a década de 1970 o Brasil é líder no Programa de Álcool Combustível. Em sua opinião, considerando todo o sistema produtivo e suas externalidades negativas, tal sistema não pode ser considerado como gerador de “energia limpa”. Sugere que a alternativa dos transportes urbanos movidos a hidrogênio, experiência alternativa realizada na cidade de São Paulo, e projetos que envolvem a utilização de biogás, estes sim podem ser considerados sustentáveis. VANKRUNKELSVEN, em visita ao Brasil no mês de abril deste ano, teve a oportunidade de conhecer o projeto Bunge - Tocantins: 75.000 hectares de cana para etanol/álcool. Em sua opinião, é um deserto verde com um consumo elevadíssimo de água.

Há de se considerar que o Brasil possui milhares de quilômetros de litoral favoráveis à energia eólica e solar. Contudo, os investimentos ainda são modestos. Revela que acredita no potencial brasileiro, tanto em recursos naturais energéticos quanto na mão-de-obra disponibilizada pela agricultura familiar.

Segundo esse mesmo autor, o processo produtivo brasileiro deveria ser canalizado para associações e cooperativas que favorecessem as propriedades de agricultura familiar: garantiria a manutenção da biodiversidade e a redução do êxodo rural. Infelizmente, produzir no modelo atual significa gerar divisas, abastecer os automóveis, e não os 44 milhões de famintos existentes no Brasil. A produção de 65% de soja, e 90% do farelo da mesma, é destinada à ração animal.

A soja transgênica é cara devido à dependência da compra de sementes e dos insumos químicos. Com a crise norte-americana, vê-se ainda a possibilidade de quem cultiva soja transgênica ter que desembolsar U$ 0,60/saca de 60 kg a título de royalties para a Monsanto? Nesse cenário, como ficam os modelos de produção agroecológicos? Seria a saída para a Agricultura Familiar? Continuará sendo a chance de sobrevivência da agricultura familiar social e ecologicamente comprometida com as pequenas propriedades? Ou a soja orgânica será recuperada pela agricultura em grande escala?

O Brasil, com todos os contratempos na questão ambiental, continua visando oportunidades na geração de divisas por intermédio do agronegócio. A China é um dos maiores consumidores de farinha de peixe à base de soja, produzida no Brasil destinada à pecuária - chegam a consumir 34 kg/ano/animal. Por outro lado, para o Brasil produzir uma tonelada de adubo, faz-se necessário uma tonelada de petróleo. A soja então pode ser considerada energia verde? A produção voltada para a exportação, nesse modelo, é uma alternativa viável? Para Luc Vankrunkelsven, destinar parte da soja para o consumo humano pode combater a fome no mundo. Ele acredita na soja produzida pela agricultura familiar, para alimento e geração de renda, cultivada de forma orgânica, consorciada, para biodiesel como energia, para o transporte de cooperativas, e como forma alternativa de energia limpa para o governo, esta sim, seria a melhor alternativa.

Na elaboração da Agenda 21 Brasileira, foi considerada fundamental que se promova a substituição progressiva dos sistemas agropecuários e florestais simplificados, como as monoculturas, por sistemas diversificados, como aqueles encontrados nas pequenas propriedades da agricultura familiar, que integrem a produção animal e vegetal. Por esse motivo, faz-se necessário as seguintes mudanças nos modelos vigentes de produção: a) real preocupação com o meio ambiente, dentro das propostas do desenvolvimento sustentável; b) elaboração de tecnologias apropriadas que poupem e conservem os recursos naturais; c) maior rigor na concessão do licenciamento ambiental, condicionando-o à adoção de sistemas de gestão ambiental; d) efetividade no monitoramento e na fiscalização pelos órgãos responsáveis; e e) políticas públicas voltadas para o fortalecimento da agricultura familiar.

Devem-se considerar a importância não apenas dos aspectos econômicos, mas dos ecológicos, sociais e culturais. Isso porque benefícios imediatos, como aqueles que o modelo do agronegócio exportador busca, geralmente, não são consistentes com o bem-estar de longo prazo, ou mesmo, com a própria sobrevivência humana. Dessa forma, alguns objetivos sociais, tais como os ganhos de bem-estar, cujas políticas de suporte exigem pré-condições ecológicas não consistentes para a manutenção da qualidade de vida, devem ser questionados para que não haja prejuízo para as gerações futuras.

Para Sachs, o desenvolvimento rural significa muito mais do que a simples produção agrícola e o agronegócio. Os empregos rurais não agrícolas permanentes e sazonais e as perspectivas de pluriatividade por parte dos membros das famílias de agricultores devem ser cuidadosamente avaliados na perspectiva de uma «urbanização» progressiva das condições de vida no campo. Tudo indica que, com o tempo, as ocupações não-agrícolas ocuparão uma parcela maior da mão-de-obra rural do que as atividades propriamente agrícolas.

Porém, a dinamização do emprego no campo e nas pequenas cidades não se dará com o atual modelo exportador. Irá depender, em última instância, da capacidade de dar um salto qualitativo na direção de um novo ciclo de desenvolvimento rural e de liderança mundial na invenção de uma civilização moderna dos trópicos, socialmente includente e ambientalmente sustentável, baseada na produção e processamento das biomassas terrestres, florestais e aquáticas. O Brasil, com destaque para os agricultores do modelo de produção familiar, particularmente aquelas que vêm adotando práticas agroecológicas, tem condições excepcionais para tanto. Dessa forma, poderá haver uma melhor distribuição dos benefícios do desenvolvimento, reduzindo os casos de pobreza extrema e de iniqüidade sócio-econômica, característicos da sociedade brasileira.


* Engenheiro Agrônomo, Mestre em Recuperação de Áreas Degradadas e Gestão Ambiental e Doutor em Engenharia de Água e Solo pela Universidade Federal de Viçosa (UFV). É professor do IFET/Rio Pomba, coordenador dos cursos Técnico em Meio Ambiente, EAD em Gestão Ambiental e Pós-graduação em Agroecologia e Desenvolvimento Sustentável. É Conselheiro do COPAM e consultor do IBAMA. E-mail: mauriciosnovaes@yahoo.com.br.

**Licenciada em Geografia, Especialista em Educação-concentração em Geografia e Gestão Ambiental. Técnica em Meio Ambiente/ Professora de Ensino Básico do Estado de Minas Gerais. Orientadora do curso de especialização de Geografia (EVATA). Vice - presidente do Instituto Ambiental Sol do Campo. E-mail: fatima@soldocampo.com

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