OS MODELOS DE PRODUÇÃO AGROPECUÁRIO E FLORESTAL
Fonte: SOUZA, Maurício Novaes. Degradação
e Recuperação Ambiental e Desenvolvimento Sustentável. Viçosa, MG: UFV,
2004. 371p. Dissertação (Mestrado em Ciência Florestal) - Universidade Federal
de Viçosa, 2004.
No complexo
contexto histórico das atividades agropecuária e florestal brasileiras, com
excesso de privilégios a determinados grupos de interesses, particularmente na
segunda metade do século XX, o crescimento da urbanização e da industrialização
superpôs-se a uma estrutura agrária essencialmente concentrada e desigual.
Dessa forma, foi implantada uma rápida dinâmica de transformação rural,
expressa no desenvolvimento de complexos agroindustriais fundamentados na
mecanização, na irrigação e no uso crescente de agroquímicos, na maioria das
vezes, todos dependentes de energia não biológica. No Brasil, a manifestação
dessa dinâmica de transformação, envolveu um conjunto integrado de políticas,
em grande parte executadas durante o governo militar, tais como: a) a renovação
nos currículos das principais escolas agronômicas, com grande influência
norte-americana; b) a criação do “Sistema Nacional de Crédito” em 1966, intenso
até os anos 90, inclusive com subsídios mal administrados, que condicionava o
apoio financeiro à aceitação de pacotes de assistência técnica, dos quais
constava a compra de sementes e insumos modernos, abrindo espaço para o mercado
desses produtos no Brasil; c) o estímulo à transformação da grande propriedade
em grande empresa, com o crescimento da mecanização em detrimento da
permanência de famílias de baixa renda no campo, seja como parceiros,
arrendatários, posseiros ou trabalhadores assalariados; e d) o desinteresse
pelo modelo familiar, que ficou praticamente excluído até recentemente, do
crédito e da assistência técnica, provocando o abandono de milhares de pequenas
propriedades pela incapacidade de competir nesse novo modelo socioeconômico
(PÁDUA, 2003).
A consequência
foi o êxodo rural, proveniente principalmente do favorecimento excessivo a
algumas regiões específicas, em detrimento de outras. Na atual crise mundial,
em que o desemprego estrutural domina os sistemas urbano-industriais, a
manutenção da desruralização como estratégia modernizadora constitui uma
atitude irracional. Porém, na prática, é o que continua acontecendo, posto que
entre 1985 e 1995, cerca de 5,5 milhões de ocupações em atividades agrícolas
foram eliminadas (SILVA, 2001; PÁDUA, 2003). De acordo com SANTO (2004), para
cada real de renda da agricultura brasileira viabiliza outros 3,5, ativando os
setores industrial e de serviços, gerando emprego e renda, impostos e divisas.
Apesar de existirem variações dentro
de cada modelo de produção e de desenvolvimento, com inúmeras formas
intermediárias entre eles, dois podem caracterizar e analisar as atividades
agropecuárias e florestais, em nível mundial (WEID, 1996): a) modelo
tradicional ou familiar; e b) modelo convencional ou agroquímico.
Ø Modelo tradicional ou familiar
A Agenda 21 Brasileira considera
fundamental que se promova a substituição progressiva dos sistemas
agropecuários e florestais muito simplificados, como as monoculturas, por
sistemas diversificados, sobretudo os rotacionais, que integrem a produção
animal e vegetal. Esses sistemas têm demonstrado uma série de vantagens
agronômicas e econômicas e estão em conformidade com os anseios do
desenvolvimento sustentável: garantir a segurança alimentar e a conservação dos
recursos naturais para as futuras gerações. A crescente concentração da
produção em torno de uma única cultura, como no caso da soja, criará problemas
econômicos, sociais e ambientais futuros. Por estas questões, a extensão e a
pesquisa têm estado voltadas, cada vez mais, para uma dupla preocupação: a)
intensificação do uso do solo nas terras já ocupadas, sobretudo nas de
pecuária; e b) desenvolvimento de fontes de geração de renda em sistemas
baseados na conservação de recursos naturais, como os sistemas agroflorestais
(SAF’s). Há sinais, apesar de discretos, que os poderes públicos estaduais e municipais
também começam a enxergar na conservação dos recursos naturais como uma fonte
para o desenvolvimento das regiões, que resumem uma estratégia de
desenvolvimento sustentável mais próxima para o interior (ENA, 2003).
Uma estratégia de desenvolvimento
sustentável no Brasil não pode, entretanto, basear-se na continuidade do
processo de degradação da riqueza que é a sua biodiversidade. Isso não
significa que se menospreze a importância das superfícies já incorporadas à
produção agropecuária e florestal. Ao contrário, a recuperação dessas áreas
deve ser a base de uma agropecuária e silvicultura sustentáveis. Os
investimentos que se fizerem nessa direção devem ser acompanhados de um imenso
esforço do governo e da sociedade - sobretudo das populações e dos poderes
existentes em cada uma das localidades - para que sejam reduzidos os
monocultivos. Estes, pela sua própria extensão, desvinculada das questões
ambientais, têm simplificado perigosamente a paisagem e reduzido grande parte
da vegetação nativa à condição de ilhas ou fragmentos florestais. Por não
possuírem dimensões permanentes, uma vez que o efeito de borda nos mesmos é
acentuado, os fragmentos têm a sua capacidade de regeneração reduzida, como
também a permanência tanto das plântulas quanto das árvores adultas.
Considerando que muitas espécies arbóreas não sobrevivem na ausência de outras
espécies, em face de suas relações ecológicas, é mais um fator negativo que
contribui para a instabilidade dessa vegetação remanescente (ENA, 2003;
BRIGANTE et al., 2003d).
Nesse
sentido, os modelos de produção agropecuários e florestais alternativos, tais
como a agroecologia, biodinâmica, orgânica, natural e a agrossilvicultura
diversificada, como nos sistemas agroflorestais (SAF’s), podem ser considerados
uma tendência. É necessário o desenvolvimento de um modelo capaz de ser
produtivo com respeito aos recursos naturais, capaz de gerar emprego e renda,
com equidade social. Na visão de ALTIERI (1989), esse modelo deve ser capaz de
otimizar: a) a disponibilidade e o equilíbrio do fluxo de nutrientes; b) a
proteção e conservação da superfície do solo; c) a utilização eficiente dos
recursos água, luz e solo; d) a manutenção de um nível alto de fitomassa total
e residual; e) a exploração de adaptabilidade, diversidade e complementaridade
no uso de recursos genéticos animais e vegetais; e f) a preservação e
integração da biodiversidade.
Os problemas
gerados pela adoção de pacotes tecnológicos, nem sempre apropriados às
características do ambiente, têm chamado a atenção para o modelo familiar. Este
modelo, conceitualmente, por não dispor destes pacotes, posto que as pesquisas
e as tecnologias utilizadas devem estar baseadas na disponibilidade dos
recursos locais, a implantação dos modelos alternativos fica facilitada pelo
modelo familiar: este é o motivo principal da sua revalorização e
reconhecimento por muitos especialistas. Por envolver um caráter artesanal,
associa-se mais facilmente à escala da gestão familiar (WEID, 1997). Essa
transformação deverá ser realizada em escala apropriada, descentralizada, com a
gestão da terra e dos recursos naturais direcionada por indivíduos inseridos no
contexto desse sistema, ou seja, que se sinta parte integrante dele e não
apenas como uma empresa que objetiva lucro.
Ø Modelo convencional ou agroquímico
Conhecido
também como modelo moderno, responsável pela “Revolução Verde”, responde ao
anseio milenar do homem de poder controlar a natureza, exercendo sobre ela o
máximo domínio e a artificialização do meio ambiente (WEID, 1996). O modelo agroquímico
desenvolveu-se na Europa e nos Estados Unidos ao longo do século XX, ganhando
importância significativa após a Segunda Guerra Mundial. O seu objetivo seria a
assimilação da agricultura à indústria, onde se pretendia exercer o controle
sobre todas as variáveis produtivas ambientais.
Neste
paradigma, um dos elementos centrais é a eliminação da biodiversidade e a
máxima homogeneização do sistema. Dessa forma, o privilégio único seria da
espécie a ser cultivada, sendo que todas as demais são consideradas
concorrentes: devendo, portanto, ser eliminadas, como também as pragas e
doenças. Dentro desse princípio, ocorre uma maior facilidade para lidar com os
parâmetros de controle, tais como água, luz e nutrientes. O objetivo final
desse modelo encontrava-se na manipulação genética das plantas, predeterminando
suas características fisiológicas, permitindo flexibilizar o controle dos
fatores ambientais, produzindo plantas que se adaptem a estes (ibidem).
O
grande problema e restrição desse modelo referem-se à redução da
biodiversidade, tornando a produção totalmente dependente de fatores externos
ao sistema propriamente dito, tais como: a) as sementes são produzidas em
laboratórios; b) os fertilizantes têm origem mineral e são processados
industrialmente; c) os defensivos agrícolas também proveem de indústrias
químicas; d) a energia utilizada tem origem fóssil; d) alta dependência de
equipamentos com elevado consumo energético, necessitando de altos
investimentos e tributário de sistemas financeiros (ibidem). A Índia, por exemplo, está terminando o processo de
substituição de suas 30 mil variedades nativas de arroz, por uma única
variedade que liquidará séculos de cultura e de conhecimento botânico (BENYUS,
1997).
Uma
outra característica desse modelo é a concentração de propriedades e a
eliminação de postos de trabalho no campo. No primeiro mundo, embora não tenha
provocado, acompanhou o esvaziamento do campo. Na Europa, houve a adoção de
medidas de política pública, em favor da agricultura familiar. O principal
sucesso desse modelo foi o significativo aumento na produtividade, tendo como consequência
direta a segurança alimentar e a queda dos preços dos produtos agrícolas (ALVES
e CONTINI, 1987; WEID, 1996; ALVES, 2001; SANTO, 2004).
Nos
ecossistemas tropicais, devido à maior heterogeneidade, ela não conseguiu obter
a mesma eficiência que nos ecossistemas temperados (WEID, 1996)
Ø
A
importância dos modelos no mundo atual e os desafios para o futuro
O
modelo agroquímico é dominante nos países desenvolvidos e emergentes, enquanto
o modelo familiar domina os países periféricos, nos quais 1,4 bilhão de pessoas
depende desse sistema para a sua sobrevivência. Em outra estimativa, 80% das
terras cultivadas em todo o mundo utilizam o sistema tradicional e, dentro dessa
realidade, existe alimento suficiente para alimentar a população mundial. De
fato, o desequilíbrio existente deve-se ao consumo desproporcional entre os
países desenvolvidos e os países subdesenvolvidos. Por esse motivo, a solução
deve vir por meio de uma melhor distribuição de renda, principalmente quando a
expectativa da população em 2025 é de 3 bilhões de pessoas superior a atual,
necessitando de uma produção em dobro daquela hoje existente. Pode-se concluir
que a questão de segurança alimentar está mais relacionada a problemas
macroeconômicos e sociais do que aos modelos de produção praticados pelos
sistemas agropecuários, pelo menos atualmente (WEID, 1996).
O interesse
do modelo convencional concentra-se nas áreas de maior fertilidade, as quais
praticamente já se encontram ocupadas. Pode ser verificada uma forte
desaceleração da velocidade de expansão das áreas plantadas dentro do modelo
agroquímico, sem ganhos significativos em produtividade. Vários fatores inibem
a otimização da produtividade: a) as condições reais são bastante diferenciadas
entre si e em relação às condições controladas em situações de pesquisa; b) os
limitantes econômicos têm colocado freios significativos no uso das opções
tecnológicas disponíveis; e c) as reações do meio ambiente têm levantado
questionamentos quanto à eficiência destas opções (ibidem).
A defesa do
modelo familiar como caminho à sustentabilidade, não se resume simplesmente à
questões conceituais, mas também em indicadores concretos: esse modelo tem
demonstrado forte capacidade de resistência, produtividade e eficácia, com
potencial de gerar emprego e renda promovendo a equidade social, apesar da
falta de apoio à pesquisas e do crédito limitado. Recentemente, foi comprovado
que, entre 1989 e 1999, as propriedades rurais com área inferior a 100 ha,
apresentaram taxa de crescimento anual médio do rendimento físico da produção,
de 5,80% contra 3,29% nas grandes propriedades. Também, a taxa anual média de
crescimento da quantidade produzida pelo modelo familiar foi de 3,79% ao ano
contra 2,60% no modelo agroquímico. Deve-se considerar, ainda, a importância do
modelo familiar na produção de produtos básicos de consumo interno,
particularmente aqueles de menor possibilidade de agregação de valores, porém
indispensáveis aos nossos hábitos alimentares, principalmente das populações de
baixa renda. Para exemplificar, ele foi responsável pela produção de 84% da
mandioca, 67% do feijão e 49% do milho. Também, apesar das limitações de área,
de crédito e também de assistência técnica, foi responsável pela produção de
32% da soja, 33% do algodão e 25% do café. Por meio de dados coletados no
período de 1995/1996, constatou-se que o modelo familiar foi responsável por
37,9% do valor bruto da produção, empregando 13,8 milhões de trabalhadores,
apesar de receber apenas 25,3% do financiamento total, cerca de 938 milhões de
reais. Com a clareza que esses dados evidenciam, considerando o universo de
11,6 milhões de pequenos proprietários que possuem em média 30 ha de terra, se
apoiados por meio de concessão de crédito e amparados pela assistência técnica,
e com uma política agrícola séria e consistente de médio e longo prazo, para
que haja segurança na condução da cultura e no processo de comercialização,
esse grupo pode constituir o eixo da agropecuária e silvicultura sustentáveis
no Brasil (PÁDUA, 2003). Inclusive a reforma agrária, que historicamente tem
sido vista como política social compensatória, pode ser pensada como um
instrumento estratégico de desenvolvimento regional sustentável (WEID, 1997;
HOMEM DE MELO, 2001; PÁDUA, 2003).
Ø
A
sustentabilidade do modelo familiar
Embora
também existam impactos ambientais no modelo familiar, devido ao pequeno
tamanho das propriedades, os impactos ambientais negativos são bem menores que
aqueles do modelo agroquímico. Devido aos baixos custos de produção pela
pequena utilização de insumos e baixa remuneração da mão-de-obra, o preço final
dos produtos pode ser inferior, além de estar menos vulnerável a bruscas
alterações sofridas pelos insumos importados (WEID, 1996).
Uma
das principais limitações desse modelo é a baixa produtividade. Porém, caso
houvessem pesquisas voltadas para o modelo familiar, na mesma proporção
direcionada ao modelo agroquímico, provavelmente soluções já teriam surgido.
Apesar destas limitações, baixa produtividade e propensão à pauperização, o
modelo familiar obedece a um processo que o aproxima da dinâmica do meio
ambiente. A diversificação de culturas promove o aumento da biodiversidade, que
é fundamental para a sustentabilidade dos recursos naturais e do ecossistema
como um todo (WEID, 1996; ZAMBERLAM e FRONCHETE, 2001).
De
acordo com Alves et al. (2001), apud
SANTO (2004), a renda obtida por produtores deste modelo, tem sido o principal
motivo que os obrigam a migrar para os centros urbanos. Estes autores estudaram
a situação dos produtores com menos de 100 ha, que representam de 86% a 90% do
número total de estabelecimentos (possuindo apenas, aproximadamente, 20% da
superfície total declarada), de acordo com os últimos 7 Censos do IBGE, desde
1950. Considerando o critério de Renda Bruta Familiar (refere-se ao valor da
produção vendida pelo estabelecimento durante todo o ano mais o consumo da
família, deduzidos os gastos com terra, máquinas e equipamentos, benfeitorias,
animais e insumos comprados ou fabricados no estabelecimento, trabalho
assalariado e mão-de-obra), apenas 36% dos estabelecimentos garantem uma
remuneração igual ou superior a dois salários mínimos. Quando o critério é
Renda Líquida Familiar (exclui os valores correspondentes ao consumo da
família, portanto cobre apenas a produção efetivamente vendida), apenas 16%
atendem essa exigência. Nas regiões mais pobres, como nos estados do Nordeste,
este problema se agrava ainda de forma mais intensa. No Ceará, 96% dos produtores
deste modelo recebem um salário mínimo ou menos.
Mediante
a situação atual de degradação ambiental, que esta condição de renda pode
incrementar, um novo modelo precisa ser desenvolvido e implementado. Não só
para garantir a sustentabilidade, mas também para propiciar condições de
recuperação de áreas degradadas, de tal forma a reincorporá-las ao processo
produtivo, evitando a abertura de novas fronteiras de exploração, que
inevitavelmente, reduzem e agridem os recursos naturais.
A
estratégia deverá ser sustentada por um tripé (SILVA, 2001; PÁDUA, 2003): a)
geração e difusão de tecnologias apropriadas; b) capacitação de todos os
membros das famílias rurais; e c) organização dos produtores. Uma ação
sinérgica desses três componentes mínimos poderá alterar a situação atual, na
direção da sustentabilidade do modelo familiar. Há que se considerar, também, a
necessidade na definição de uma política agrícola consistente e de longo prazo,
tais como a liberação de financiamentos, seguro, garantia de preço mínimo que
cubra o custo de produção e uso de tecnologias.
Para OLIVEIRA
JÚNIOR (2004), a incorporação de tecnologia ao perfil dos produtores do modelo
familiar poderá ser realizada de acordo com as características diferenciadas
por região, culturas e nicho de mercado onde estes estão inseridos. Isto
porque, os principais problemas que atualmente afetam os sistemas produtivos
neste segmento, referem-se a falta de recursos financeiros, volume e tempo para
produção agrícola, apoio técnico para as atividades dentro da propriedade e a
titulação das terras. De acordo com este mesmo autor, no Estado de Roraima, um
grupo de produtores foi selecionado para instalação e cultivo protegido, a
partir de 2002. Com a adoção de tecnologia subsidiada, promoveu-se um
incremento da produção agrícola, voltada para a horticultura, gerando produtos
selecionados. Resultados de pesquisas atuais inserem a agricultura familiar
como parte da cadeia produtiva e do agronegócio, gerando renda suficiente para
o estabelecimento do homem no campo. Embasado nestes resultados, depreende-se
que este modelo se torna rentável, desde que sejam adotadas as tecnologias
adequadas e respeitadas as questões ambientais e o aproveitamento racional dos
recursos naturais.
Ø
A
sustentabilidade do modelo agroquímico
A
sustentabilidade do modelo agroquímico, além das questões já expostas, pode ser
questionada por três principais motivos (WEID, 1996): a) a tendência de
esgotamento da matriz energética; b) o horizonte reduzido de durabilidade de
minerais como o fósforo e o potássio; e c) os altos custos unitários dos insumos
de produção. Além desses fatores, há também os impactos ambientais provocados
pelo modelo agroquímico, tais como: a) erosão; b) poluição e assoreamento dos
corpos d’água; c) desequilíbrio nas cadeias naturais; d) eclosão de novas
pragas e doenças; e) chuvas ácidas; f) destruição da camada de ozônio e aumento
dos gases de efeito estufa; e f) destruição das florestas e da biodiversidade
de espécies da fauna e da flora. Essa perda de diversidade torna o modelo
agroquímico cada vez mais vulnerável, logo insustentável no médio e longo prazo
(WEID, 1996; AMADOR, 1999). No capítulo II, relativo à Recuperação Ambiental,
os impactos ambientais produzidos serão discutidos mais intensivamente.
Além dos já
citados, os principais aspectos que garantem a insustentabilidade desse modelo,
são (SILVA, 2001; PÁDUA, 2003):
·
Degradação ecológica de grandes áreas, com a
perda e a conversão de biomas nativos para a sua incorporação como áreas de
exploração agropecuária e florestal;
·
Desgaste ecológico das áreas em exploração, particularmente
à perdas de solo por processos erosivos, ao desperdício de água e à
contaminação por agroquímicos (no Brasil, entre 1964 e 1991, o consumo de
agrotóxicos aumentou 276,2%, contra 76% do aumento de área plantada; e
·
Riscos de salinização dos solos pelo manejo
incorreto da irrigação e depleção dos mananciais (o Mar de Aral, na antiga
União Soviética, que vem sofrendo uma intensa redução de sua superfície -
66.900 Km2 em 1960 para 31.938 Km2 em 1994 - devido ao
intenso uso de suas águas para irrigação e, com a redução do volume d’água, são
originadas grandes áreas salinizadas - TUNDISI, 2003).
Ø O direcionamento da pesquisa
Várias
correntes de modelos inovadores de pesquisa são potencialmente promissoras,
conhecidos genericamente por modelos alternativos. O ponto comum é a tentativa
de harmonizar todos os processos de atividades agropecuárias e florestais com
as funções essenciais do meio ambiente (WEID, 1996; ZAMBERLAM e FRONCHETI,
2001).
Entretanto,
há que se considerar, que as atuais linhas de pesquisa apresentam insuficiente
e inadequado fluxo de recursos financeiros que suportem as demandas necessárias
para o estudo mais aprofundado e o aperfeiçoamento destes modelos alternativos.
A maioria das técnicas é desenvolvida informalmente, pelos próprios
agricultores, faltando pesquisas científicas necessárias à sua certificação,
dentro de suas propriedades e dirigidas para o estudo das interações bióticas e
abióticas existentes dentro dos sistemas (ibidem).
A EMATER-MG, recentemente, criou um programa de incentivo à agricultura
orgânica, oferecendo cursos, assistência técnica, procurando viabilizar
negócios, inclusive com a instalação de feiras em locais públicos, além de
estímulos à agroindústria. Porém, os recursos têm sido escassos e o número de pessoal
qualificado é reduzido para atender à demanda (EMATER, 2003a).
Estas
questões são preocupantes, posto que, de acordo com BORLAUG (2004), 85% do
crescimento futuro da produção terão de vir de terras já em produção. O
potencial de terras disponíveis é limitado. Deve-se, portanto, investir
maciçamente em pesquisas, visando o aumento de produtividade, com
sustentabilidade.
Como
consequência da necessidade de estabelecer alternativas viáveis às diretrizes
estabelecidas na Agenda 21, vários agentes de financiamento têm apoiado e
disseminado programas de desenvolvimento inovadores que sejam capazes de
atingir os objetivos esperados. Em especial, a Organização das Nações Unidas
(ONU), tem estabelecido vários programas nesse sentido (GUNTER, 1999).
As
questões relativas a qual modelo adotar são bastante polêmicas, por interesses
diversos. Porém, nos países desenvolvidos, o combate à degradação do meio
ambiente vem sendo praticado há algum tempo. No Brasil, recentemente, a ideia
conservacionista tem crescido significativamente, amparada nas Constituições
Federal e Estaduais, no Código Florestal Brasileiro e nas Leis Estaduais. Tais
medidas, respaldadas na justiça, mostram a preocupação legislativa e popular em
disciplinar o uso dos recursos naturais, visando assegurar a conservação da
qualidade do meio ambiente, para todos os modelos de produção.
No
Quadro 1, estão resumidas as principais características que diferem o modelo
familiar do agroquímico, justificando as atenções da necessidade e da
importância da pesquisa ao modelo familiar.
QUADRO 1 - Principais diferenças entre
os modelos familiar e agroquímico
Aspectos
|
Modelo familiar
|
Modelo agroquímico
|
Tecnológicos
|
Adapta-se às diferentes condições regionais, aproveitando
ao máximo os recursos locais.
Práticas de convivência com limitações:
·
Atua
considerando o agrossistema como um todo, procurando antever as possíveis consequências
da adoção das técnicas; e
·
O
manejo do solo visa movimentação física mínima, conservando a fauna e a
flora.
|
Desconsideram-se as condições locais, impondo pacotes
tecnológicos.
Práticas de redução de limitações:
·
Atua
intensivamente sobre os fatores produtivos, visando somente o aumento da
produção e da produtividade.
·
O
manejo do solo, com intensa movimentação, desconsidera sua atividade orgânica
e biológica.
|
Ecológicos
|
·
Grande
diversificação. Policultura e, ou, culturas em rotação.
·
Integra,
sustenta e intensifica as interações biológicas.
·
Associação
da produção animal à vegetal.
·
Agrossistemas
formados por espécies de potencial produtivo alto ou médio e com relativa
resistência às variações das condições ambientais.
|
·
Pouca
diversificação. Predominância de monoculturas.
·
Reduz
e simplifica as interações biológicas.
·
Sistemas
pouco estáveis, com grandes possibilidades de desequilíbrios.
·
Formado
por indivíduos com alto potencial produtivo, que necessitam de condições
especiais para produzir e são altamente suscetíveis às variações ambientais.
|
Socioeconômicos.
|
·
Retorno
econômico a médio e longo prazo, com elevado objetivo social.
·
Baixa
relação capital/homem
·
Alta
eficiência energética. Grande parte da energia introduzida e produzida é
reciclada.
·
Alimento
de alto valor biológico e sem resíduos químicos.
|
·
Rápido
retorno econômico, com pouca consideração para redistribuição de renda.
·
Maior
relação capital/homem.
·
A
maior parte da energia gasta no processo produtivo é proveniente de fora do
sistema, sendo em grande parte, dissipada em seu interior, aumentando a sua
entropia.
·
Alimentos
de menor valor biológico e com resíduos químicos.
|
Fonte:
SCHAEFER et al., 2000.