terça-feira, 15 de agosto de 2017

O RIDÍCULO POLÍTICO: efeito da deturpação da política na era do espetáculo!



Estive em Brasília nesse fim de semana: a cidade mais capitalista do Brasil! Como não podia deixar de ser, relembrando meus treze anos lá vividos, reencontrei parentes e amigos e, claro, conversamos o assunto que mais se falava em Brasília: política! O sentimento das pessoas de lá é semelhante ao daqui: muito espanto e desapontamento, beirando a indignação!!! Mas, infelizmente, observa-se na maioria das pessoas, apatia. Para agravar tal quadro, em todo o País, existe muita desinformação e extremismos: tanto de esquerda quanto de direita. O fato é que o atual momento político tem afastado as pessoas sérias da política! Quanto mais grave a fragilidade dos partidos políticos, mais aguda a crise de representação das casas legislativas (de acordo com pesquisa do IPSOS, 65% não confiam no Congresso!) Quais são as consequências?

Bem, agora mesmo, assistindo ao programa Diálogos, do Mário Sérgio Conti na Globonews, tive a oportunidade de assistir a entrevista da Filósofa Marcia Tiburi. Lançará seu novo livro agora à noite em Porto Alegre, cujo título é bastante sugestivo: Ridículo Político! Gostei tanto da nomenclatura utilizada, que já o comprei. Em seu livro, a escritora analisa fenômenos que tornam o cidadão um ser apático, o que coloca a democracia em risco. O argumento é construído a partir de conceitos simples, para que possam ser amplamente compreendidos. Para ela, um espectro ronda a política – o espectro do ridículo político. Esse fenômeno, que se revela em elogios à tortura no Congresso brasileiro, no governo de Donald Trump nos Estados Unidos e em outras manifestações, ganha uma análise consistente em seu livro.

A filósofa, que no ensaio anterior havia se dedicado ao fascismo, mostra-se agora preocupada com um contexto em que a regra é não tratar a política com seriedade. Trata de vergonha alheia, elite brega, cidadão otário, madamismo (culto à vida de madame), filosofia do rolê, falação de merda, minotaura, Valesca Popozuda, ipanemismo (relativo ao bairro Ipanema - classe média carioca) e esteticomania. As teses são apresentadas em cadeia, em capítulos curtos. Essa opção da autora, por termos populares e tópicos enxutos, talvez tenha como influência sua experiência na mídia. Acostumada com programas de TV, entrevistas e palestras disputadas, Marcia é muitas vezes reconhecida como pensadora pop, integrante de uma turma que inclui Leandro Karnal, Luiz Felipe Pondé e Mario Sergio Cortella.

Mas o livro mostra uma ensaísta extremamente dura em relação à mídia e à sua moldura - o capitalismo. A obra dialoga com Theodor Adorno e Max Horkheimer, expoentes da Escola de Frankfurt e primeiros críticos, ainda na década de 1930, da indústria cultural: máquina capaz de transformar a arte em uma linha de produção de mercadorias. O francês Guy Debord, estudioso da sociedade do espetáculo, completa o trio de teóricos que inspiram a autora.

No final dos anos 1960, Debord apontou que, na sociedade capitalista, as relações sociais passaram a ser mediadas pelas imagens. Para ele, a realidade, o cotidiano das pessoas, é influenciada pela lógica mercadológica, borrando as fronteiras entre essência e aparência. A partir daí, Marcia sugere que, se a questão central hoje é aparecer, torna-se necessário acabar com os constrangimentos humanos que prejudicam a realização dessa regra social.

O primeiro efeito é o fim da vergonha: resultado que permite ao ridículo sair do armário sem qualquer inibição. O ridículo, aquilo que inicialmente não deveria ser visto por causar embaraços e desprazer, torna-se, assim, normal e estratégia de sobrevivência no mundo das imagens, da exposição total e do chamar atenção a qualquer preço. "Criamos uma espécie de dialética perversa entre amar a própria imagem, sermos vistos e acreditarmos que isso assegura, de algum modo, nosso existir", descreve a filósofa. Essa dinâmica, continua a autora, perpassa, nas diferentes classes sociais, diversas situações da vida cotidiana, como a necessidade de ostentar o próprio gosto, ouvindo música alta em local público, por exemplo. Há ainda o narcisismo nas redes sociais, as selfies, a plastificação do corpo e o culto ao exercício físico no qual não é a saúde a principal preocupação, mas sim a "servidão à imagem".

Marcia mostra como o ridículo passou a ser instrumentalizado na política. A política, transformada pela racionalidade publicitária, deixa de ser vista como uma "construção universal". O espetáculo deturpa a política e os direitos de aparecer, de se expressar, de representar e de ser representado. Esse contexto abre espaço ao bufão, o político que, utilizando o ridículo como capital eleitoral, brinca nos momentos em que deveria haver seriedade e encanta quem já não vê a política como o diálogo que nos torna humanos. O bufão é um personagem quase de ficção, simpático e populista, que, por tanta “falação de merda”, não parece estar dizendo a verdade.

Idiotizados pela estetização da política e pelo sistema neoliberal, os eleitores não acreditariam que os líderes que apoiam sejam de fato fascistas, homofóbicos e machistas. Se não levam a sério quem se propõe a liderar, também lavam as mãos de qualquer responsabilidade nas escolhas. Para Marcia, há nisso um risco altíssimo: "Assim, sem ter para onde ir, desarvorados, apatetados, muitos preferem cancelar a política, tomando-a como aquilo que faz mal, quando, na verdade, a reinvenção da experiência política seria a única chance de produzir algo de bom, enquanto seres sociais, seres relacionados uns aos outros, que, necessariamente, terão de compartilhar o mesmo espaço. Ou consumir-se em guerra".

TRECHO DO LIVRO:

"O termo ridículo é usado tanto para falar de algo insignificante, daquilo que não faria diferença, quanto para dar sinal de uma cena escandalosa. Neste livro, quer-se compreender seu potencial intimamente ligado, em nosso tempo, ao que podemos denominar o momento publicitário da política, que muito tem contribuído para a aniquilação de sua própria ideia como algo positivo. O problema é que a política não é algo que se destrói, mas algo que se transforma, e, nesse caso, podemos dizer que o ridículo político é sua deturpação. O que vem a ser política na era da racionalidade publicitária é a nossa questão. O ridículo político é um efeito da deturpação da política na era do espetáculo; é a deturpação do direto a aparecer, bem como do direito à expressão, do direito de representar e ser representado. Ridículo político seria, portanto, a forma visível da crise do político enquanto o poder o utiliza justamente para acobertar a crise."

Em um determinado trecho da entrevista, depois de todo esse diagnóstico da situação atual, Conti pergunta: há saída? Márcia responde que está muito preocupada com a alma das pessoas: como esse distanciamento e novas posturas se transformará em discurso? Para ela, a política é espaço para discursos - um deles é que o poder corrompe. Cita a Deputada Erundina, que dizia: se o poder não fosse bom, o homem não estaria lá!!!

O fato é que o povo se afastou da política! É como se fosse um local podre, corrupto! E acrescenta, pessimista - o problema maior é a indústria da corrupção: a corrupção sistêmica que corrompe a alma das pessoas. Para promover mudanças no médio e longo prazos, para Márcia, é preciso trabalhar a educação, trabalhar o discernimento: as pessoas hoje não conversam mais, e quando falam sobre política, e outros assuntos mais densos, o que se vê é gente falando asneiras, sem conhecimento de causa!

Para Márcia, diante da derrocada da política clássica, surge uma renovação, uma singularidade: periferias, sexualidade, todos que estão na contramão do estereótipo clássico... branco... europeu... heterossexual.... as minorias estão reivindicando espaço: como será esse novo mundo? Será a tendência e os novos dominantes?

A OBRA:
TIBURI, MARCIA. Ridículo Político. Porto Alegre: Record. 236 p.

Fonte: http://zh.clicrbs.com.br/rs/entretenimento/livros/noticia/2017/07/em-novo-livro-filosofa-marcia-tiburi-disseca-o-ridiculo-politico-9831068.html

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