*Maurício
Novaes Souza
Retrocesso
significa o ato de retroceder, andar para trás, recuar! Com a decisão do governo de acabar com a Reserva Nacional
de Cobre e Associados (RENCA) na Amazônia, ao permitir a mineração na área, pode-se
afirmar que o retrocesso ambiental do governo Temer é evidente! Agrava-se a
situação pelo fato de que existe uma percepção difusa por parte da sociedade: minerar
e gerar empregos naquela região pode significar “progresso e desenvolvimento”.
O território liberado para exploração de atividades
minerárias na RENCA é do tamanho do Estado do Espírito Santo. Mesmo que o
governo fiscalize as empresas autorizadas a operar as minas, argumento usado
pelo governo, não será possível acompanhar os grileiros, aventureiros,
garimpeiros e outros grupos que vão se instalar no que antes era uma reserva
ambiental. Para a WWF, a liberação de área protegida na Amazônia é um movimento
muito perigoso. De acordo com o seu coordenador no Brasil, a corrida pela exploração pode
gerar conflitos na região. Para ele, a extinção da reserva ocorreu de
forma açodada, sem discussão. Neste momento de desespero e de crise, estão
colocando em risco as áreas protegidas que se encontram dentro da reserva. A questão se agrava quando o governo toma tal
decisão por decreto, sem discutir com a sociedade. Por que isso não foi feito
via projeto de lei, que exige audiência pública? Todos sabem a importância da
mineração para a economia brasileira, mas é preciso saber o risco envolvido.
No Brasil, temos vários exemplos de contaminação
mineral - um rio contaminado coloca em risco os povos da floresta que vivem do
consumo de peixe. No caso da extinção da RENCA, é possível que se perpetuem a mineração
em pequena escala, em garimpos, como grandes grupos internacionais. Como
garantir que as grandes empresas de mineração sigam acordos de cooperação dos
quais o Brasil não é signatário? Esses acordos preveem regras mais modernas de
exploração. Mas como saber se as empresas vão cumprir no Brasil regras que
seguem em seus países de origem? Há sempre o risco de tragédias como a de
Mariana que afetaram drasticamente o rio Doce!
As
manifestações populares foram intensas a partir dessa decisão governamental de
extinção da RENCA. Encabeçada pelo Ministério Público Federal (MPF), uma
mobilização contra o que os participantes classificam como o “avanço do
retrocesso ambiental” ganhou as redes sociais, ganhando a adesão de milhares de
internautas, entre eles integrantes da força-tarefa da Operação Lava Jato e da
modelo Gisele Bündchen. Contrário às medidas, o MPF convidou membros dos ministérios
públicos estaduais, de ONGs como Greenpeace e WWF a se manifestarem no Twitter.
Apenas o MPF publicou mais de 50 comentários críticos às mudanças nas leis em
sua página oficial no Twitter. Procuradorias federais de vários estados também
aderiram à campanha. Para o coordenador da força-tarefa da Operação Lava Jato,
Deltan Dallagnol, a eventual aprovação da Lei Geral de Licenciamento Ambiental
(PL 3.729), em discussão na Câmara, enfraquecerá o processo de licenciamento
ambiental.
Para
o El País, o Congresso quer votar medidas que ampliarão o desmatamento. Além
disso, as propostas de redução dos direitos sociais dominam a pauta do
atual governo, que a cada dia mais se afunda pelas investigações de corrupção e
pela crise, gerando outras propostas apressadas. O Brasil caminhava,
principalmente de 2003 a 2009, para cumprir a Meta 11 das “Metas de Aichi”,
acertadas no âmbito da Convenção sobre Diversidade Biológica, consistente na
proteção, até 2020, de pelo menos 17% de áreas terrestres e de águas
continentais e 10% de áreas marinhas e costeiras. Entre 2005 e 2012, o país foi
um dos que mais contribuiu para a mitigação das mudanças climáticas, resultado
obtido também pela criação de unidades de conservação, com o desmatamento, que
chegou a 27.000 km² em 2004,
baixando para 4.500 km² em 2012.
Foi nesses termos que, na Conferência do Clima em Paris (COP 21), o Brasil se
comprometeu a zerar o desmatamento ilegal na Amazônia brasileira até 2030 e a
reduzir as emissões de gases de efeito estufa em 37% até 2025 e em 43% até
2030, tendo como referência os níveis de 2005.
Para
Leandro Mitidieri, Procurador da República, quando
ainda se lutava pela consolidação dessa nova atitude e pela efetivação do
arcabouço de unidades de conservação existentes, surge um ataque, nunca antes
visto, ao que foi duramente alcançado, com um pacote de medidas provisórias e
propostas legislativas de redução e extinção de várias dessas áreas protegidas,
inclusive na Mata Atlântica. Apesar da Constituição exigir lei formal
para a supressão de unidades de conservação, adotou-se o regime de urgência das
medidas provisórias para esse ataque, ao invés de um processo cuidadoso e
amparado em estudos técnicos. Há de se considerar, ainda, o fato de que o já
combalido Ministério do Meio Ambiente sofreu redução de 53% no seu orçamento
para 2017.
Será
que vamos regredir para o estágio em que se acreditava que os recursos naturais
eram ilimitados? Talvez não seja prudente para os próprios produtores duvidarem,
por exemplo, que a floresta amazônica exporta rios aéreos de vapor para irrigar
regiões distantes no verão hemisférico, fazendo dela valiosa parceira das
atividades humanas que requerem chuva no momento necessário, um clima
ameno e proteção de eventos climáticos extremos. É sabido que é possível
produzir e reduzir o desmatamento: alcançou sua maior redução, de 2005 a 2012,
simultaneamente a um período de saltos extraordinários da produção agropecuária
brasileira. Entretanto, em operações como a recente “Carne Fria”,
identificaram-se empresas que vêm comprando gado de áreas desmatadas
ilegalmente - indicam que a sanha do agronegócio avança incontrolável nos dias
atuais, agravando a situação ambiental na região amazônica, com aval do atual
governo.
* Engenheiro Agrônomo, Mestre em
Recuperação de Áreas Degradadas e Gestão Ambiental e Doutor em Engenharia de
Água e Solo pela Universidade Federal de Viçosa. Foi professor do IF Sudeste de
Minas campus Rio Pomba. Atualmente, IFES campus de Alegre. E-mail: mauricios.novaes@ifes.edu.br.
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