sexta-feira, 8 de setembro de 2017

Governo Temer patrocina o retrocesso ambiental


*Maurício Novaes Souza

Retrocesso significa o ato de retroceder, andar para trás, recuar! Com a decisão do governo de acabar com a Reserva Nacional de Cobre e Associados (RENCA) na Amazônia, ao permitir a mineração na área, pode-se afirmar que o retrocesso ambiental do governo Temer é evidente! Agrava-se a situação pelo fato de que existe uma percepção difusa por parte da sociedade: minerar e gerar empregos naquela região pode significar “progresso e desenvolvimento”.
O território liberado para exploração de atividades minerárias na RENCA é do tamanho do Estado do Espírito Santo. Mesmo que o governo fiscalize as empresas autorizadas a operar as minas, argumento usado pelo governo, não será possível acompanhar os grileiros, aventureiros, garimpeiros e outros grupos que vão se instalar no que antes era uma reserva ambiental. Para a WWF, a liberação de área protegida na Amazônia é um movimento muito perigoso. De acordo com o seu coordenador no Brasil, a corrida pela exploração pode gerar conflitos na região. Para ele, a extinção da reserva ocorreu de forma açodada, sem discussão. Neste momento de desespero e de crise, estão colocando em risco as áreas protegidas que se encontram dentro da reserva. A questão se agrava quando o governo toma tal decisão por decreto, sem discutir com a sociedade. Por que isso não foi feito via projeto de lei, que exige audiência pública? Todos sabem a importância da mineração para a economia brasileira, mas é preciso saber o risco envolvido.
No Brasil, temos vários exemplos de contaminação mineral - um rio contaminado coloca em risco os povos da floresta que vivem do consumo de peixe. No caso da extinção da RENCA, é possível que se perpetuem a mineração em pequena escala, em garimpos, como grandes grupos internacionais. Como garantir que as grandes empresas de mineração sigam acordos de cooperação dos quais o Brasil não é signatário? Esses acordos preveem regras mais modernas de exploração. Mas como saber se as empresas vão cumprir no Brasil regras que seguem em seus países de origem? Há sempre o risco de tragédias como a de Mariana que afetaram drasticamente o rio Doce!
As manifestações populares foram intensas a partir dessa decisão governamental de extinção da RENCA. Encabeçada pelo Ministério Público Federal (MPF), uma mobilização contra o que os participantes classificam como o “avanço do retrocesso ambiental” ganhou as redes sociais, ganhando a adesão de milhares de internautas, entre eles integrantes da força-tarefa da Operação Lava Jato e da modelo Gisele Bündchen. Contrário às medidas, o MPF convidou membros dos ministérios públicos estaduais, de ONGs como Greenpeace e WWF a se manifestarem no Twitter. Apenas o MPF publicou mais de 50 comentários críticos às mudanças nas leis em sua página oficial no Twitter. Procuradorias federais de vários estados também aderiram à campanha. Para o coordenador da força-tarefa da Operação Lava Jato, Deltan Dallagnol, a eventual aprovação da Lei Geral de Licenciamento Ambiental (PL 3.729), em discussão na Câmara, enfraquecerá o processo de licenciamento ambiental.
Para o El País, o Congresso quer votar medidas que ampliarão o desmatamento. Além disso, as propostas de redução dos direitos sociais dominam a pauta do atual governo, que a cada dia mais se afunda pelas investigações de corrupção e pela crise, gerando outras propostas apressadas. O Brasil caminhava, principalmente de 2003 a 2009, para cumprir a Meta 11 das “Metas de Aichi”, acertadas no âmbito da Convenção sobre Diversidade Biológica, consistente na proteção, até 2020, de pelo menos 17% de áreas terrestres e de águas continentais e 10% de áreas marinhas e costeiras. Entre 2005 e 2012, o país foi um dos que mais contribuiu para a mitigação das mudanças climáticas, resultado obtido também pela criação de unidades de conservação, com o desmatamento, que chegou a 27.000 km² em 2004, baixando para 4.500 k em 2012. Foi nesses termos que, na Conferência do Clima em Paris (COP 21), o Brasil se comprometeu a zerar o desmatamento ilegal na Amazônia brasileira até 2030 e a reduzir as emissões de gases de efeito estufa em 37% até 2025 e em 43% até 2030, tendo como referência os níveis de 2005.
Para Leandro Mitidieri, Procurador da República, quando ainda se lutava pela consolidação dessa nova atitude e pela efetivação do arcabouço de unidades de conservação existentes, surge um ataque, nunca antes visto, ao que foi duramente alcançado, com um pacote de medidas provisórias e propostas legislativas de redução e extinção de várias dessas áreas protegidas, inclusive na Mata Atlântica. Apesar da Constituição exigir lei formal para a supressão de unidades de conservação, adotou-se o regime de urgência das medidas provisórias para esse ataque, ao invés de um processo cuidadoso e amparado em estudos técnicos. Há de se considerar, ainda, o fato de que o já combalido Ministério do Meio Ambiente sofreu redução de 53% no seu orçamento para 2017.
Será que vamos regredir para o estágio em que se acreditava que os recursos naturais eram ilimitados? Talvez não seja prudente para os próprios produtores duvidarem, por exemplo, que a floresta amazônica exporta rios aéreos de vapor para irrigar regiões distantes no verão hemisférico, fazendo dela valiosa parceira das atividades humanas que requerem chuva no momento necessário, um clima ameno e proteção de eventos climáticos extremos. É sabido que é possível produzir e reduzir o desmatamento: alcançou sua maior redução, de 2005 a 2012, simultaneamente a um período de saltos extraordinários da produção agropecuária brasileira. Entretanto, em operações como a recente “Carne Fria”, identificaram-se empresas que vêm comprando gado de áreas desmatadas ilegalmente - indicam que a sanha do agronegócio avança incontrolável nos dias atuais, agravando a situação ambiental na região amazônica, com aval do atual governo.


* Engenheiro Agrônomo, Mestre em Recuperação de Áreas Degradadas e Gestão Ambiental e Doutor em Engenharia de Água e Solo pela Universidade Federal de Viçosa. Foi professor do IF Sudeste de Minas campus Rio Pomba. Atualmente, IFES campus de Alegre. E-mail: mauricios.novaes@ifes.edu.br.

Nenhum comentário:

Resenha: Biografia do Abismo

Resenha:  Biografia do Abismo Autores: Graciandre Pereira Pinto Maurício Novaes Souza Título do livro: Biografia do Abismo   Referência ...